A taxa de inflação do país cresceu nos últimos quatro anos. Famílias percebem diminuição do poder de compra em relação ao ajuste no salário que recebem.
Gabrielle Ramos Venceslau
Entre 2018 e 2021, a inflação oficial do Brasil aumentou gradativamente. A quatro anos atrás, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) foi de 3,75%, taxa que saltou para 10,06% no último ano. Apesar do reajuste salarial feito em 2021, hoje, é possível comprar apenas 2 terços daquilo que se comprava há quatro anos atrás, pois, o real perdeu 27,57% de seu valor durante esses anos.
Cerca de 11 das capitais do Brasil têm a cesta básica como equivalente a mais de 50% do salário mínimo em março deste ano, de acordo com pesquisa feita pelo Dieese (Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos).
Mais da metade da população teve que cortar gastos nos últimos seis meses e mais de 30% precisou fazer cortes “grandes ou muito grandes”, segundo pesquisa encomendada pela CNI (Confederação Nacional da Indústria) à FSB Pesquisa. Isso ocasiona a diminuição no poder de compra das famílias brasileiras.
A inflação é um fator natural da economia, pois acontece em decorrência das atividades econômicas do país. Contudo, quando a inflação aumenta aceleradamente, os preços de produtos e serviços também sobem. “Isso acaba trazendo um problema muito grande para sociedade, pois as pessoas acabam perdendo o seu poder de compra de forma muito rápida”, explica a economista e especialista em finanças, Laura Pacheco.
De acordo com a economista e correspondente bancária, Nayara Fernanda, as famílias tendem a reduzir e cortar gastos, como alternativa para enquadrar o novo custo de vida, diante da alta dos preços. Por isso, a qualidade de vida delas diminui e a probabilidade de endividar-se aumenta.
Os fatores da inflação são diversos, desde a lei da demanda e oferta, quando se tem muita procura por um bem ou serviço, levando o preço dos itens como forma de valorizar o produto e aumentar o ganho; até o processo de inflação descontrolada, que pode ocasionar a depreciação da moeda. Independentemente da razão desse aumento dos preços, todas as classes sociais são afetadas, afirmam as economistas.
A população menos favorecida é muito mais afetada pela inflação, em virtude da queda no poder de compra. Porém, a classe empresarial também sofre impactos devido a queda no consumo e aumento da taxa de juro, como meio de frear a inflação. “Neste sentido, o público que possui vantagem sobre estes indicadores são os investidores, o que é um número muito baixo”, explica Nayara.
Apesar do aumento do salário mínimo ser maior em relação aos últimos anos, isso não melhora as condições de vida dos brasileiros. Pois o poder de compra de produtos básicos que o brasileiro tem é bastante reduzido frente ao que seria o adequado. “É um ajuste só pra dar uma ‘melhoradinha’ na situação, mas não garante a qualidade de vida”, opina Laura.
O reajuste salarial é feito com base na inflação, a fim de manter o nível de compra da remuneração mínima. Ou seja, o ganho real ocorre apenas quando o reajuste fica acima da inflação. Contudo, isso ocasionaria hiperinflação – nome dado à inflação que atinge proporções acima dos níveis considerados adequados. “Se possuímos uma renda superior à inflação, o consumo aumentaria e provocaria consequências ruins”, afirma Nayara.
O Ministério da Economia explica que o reajuste não pode ser acima da inflação porque o governo não tem recursos necessários. Caso isso fosse feito, seria gerado uma crise fiscal e o rompimento do teto de gastos.
Em 2017, um salário mínimo era suficiente para encher cinco tanques de gasolina de 50 litros, considerando o preço médio por litro da época, que é calculado pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). Atualmente, um salário consegue encher menos de 4 tanques. “O óleo custava R$3,99 e hoje custa R$10,90 ou até R$12,00. Como que o salário vai acompanhar essa inflação?”, questiona Marcos Pereira, que trabalha no administrativo de uma empresa no sul da Bahia.
Márcia Gualberto, servidora estadual concursada, conta que o aumento nos preços da gasolina e no valor do kwh de energia elétrica foram os que mais afetaram o seu orçamento. “O tanque do carro que uso, em meados de 2021, poderia ser integralmente abastecido com aproximadamente R$155,00. Atualmente, eu preciso dispor de R$ 240,00”, relata. Ela diz que o combustível é indispensável para a sua logística diária, ou seja, o aumento desta despesa compromete bastante o seu orçamento familiar e dificulta a manutenção da qualidade de vida de sua família.
“A Constituição Federal garantiu um salário digno, mas na prática nunca aconteceu”, complementa Márcia. Pois, para ela, as políticas de reajuste e valorização do salário mínimo jamais permitiram o alcance de tal propósito. O salário mínimo em abril de 2022 é de R$1.212,00; enquanto é necessário R$ 6.754,33 para que um cidadão brasileiro consiga viver com boa qualidade de vida, de acordo com a Pesquisa nacional da Cesta Básica de Alimentos feita pelo Dieese.
Marcos precisou fazer ajustes financeiros em sua casa. “Não tive um corte de gasto específico, porque já venho cortando a muito tempo”, explica. Essa mesma vivência também é experienciada por Márcia, que realizou ajustes no consumo de energia e gasolina, trocou marcas de produto no supermercado, reduziu refeições realizadas fora de casa e diminuiu os passeios longe de onde mora, Recife/PE.