A inclusão financeira dos brasileiros através da tecnologia

In Economia, Geral

Como a economia digital tem auxiliado na democratização dos serviços bancários no Brasil. 

Raíssa Oliveira

Imagine um mundo que com apenas alguns toques na tela você consegue quebrar barreiras burocráticas, eliminar as filas dos caixas e lotéricas e extinguir toda a papelada dos bancos. Em poucos segundos, suas transferências financeiras acontecem e a complexidade da vida econômica se dissolve em uma experiência prática e intuitiva, tornando o que era demorado em algo simples e rápido.

O que parecia futurista agora é uma realidade com o crescimento do e-commerce, impulsionado pela pandemia de COVID-19 que modificou drasticamente os hábitos de consumo da sociedade, em que a economia digital também alavancou de maneira significativa e passou a desempenhar um papel fundamental no mercado brasileiro. A partir desse contexto, formas de pagamento foram criadas e popularizadas, além de alternativas novas de bancos e carteiras digitais, ampliando o acesso a serviços financeiros e facilitando as transações online.  

O surgimento do Pix, sistema de pagamentos instantâneos do Banco Central, foi um marco para a inclusão financeira no Brasil e é o meio de pagamento mais popular e utilizado pelos brasileiros, oferecendo transações rápidas, seguras e isentas de tarifas.

De acordo com um levantamento realizado pela Federação Brasileira de Bancos (Febraban), foram registradas aproximadamente 42 bilhões de transferências financeiras instantâneas pelo Pix em 2023, representando um crescimento de 75% relacionado ao ano anterior. O Banco Central afirma que esse meio de pagamento eletrônico foi responsável por incluir 71,5 milhões de usuários no sistema financeiro.  

Além das transações instantâneas, carteiras e bancos digitais, fintechs e cartões de débito e crédito são formas de pagamento e acessos a serviços bancários que se popularizaram nos últimos anos e foram grandes responsáveis pela maior democratização financeira no Brasil.

Ademil Lopes, coordenador do curso de Economia da Universidade de Araraquara, observa que esse avanço tecnológico expandiu o acesso a serviços financeiros para populações de baixa renda que enfrentavam dificuldades para acessar o sistema bancário formal no Brasil, principalmente devido ao alto custo e burocracia. “A economia digital contribuiu diretamente para o crescimento econômico do país, oferecendo uma nova dinâmica para a circulação de dinheiro, incentivando bastante o empreendedorismo e permitindo que muitos brasileiros participem ativamente da economia formal no Brasil”, enfatiza o professor. 

Perigos recorrentes

Como nem tudo é um mar de rosas, as facilidades também trazem riscos para a segurança dos usuários, especialmente no que se refere a ataques cibernéticos, vazamento dos dados pessoais e fraudes digitais, sendo difícil identificar a origem dessas ameaças.

O advogado Estevão Campos, com experiência na área de direito digital e foco no Tratamento de Dados Pessoais em uma empresa de tecnologia, entende que a ampliação dos serviços bancários para os meios digitais apresenta riscos à privacidade dos consumidores e ao controle dos dados financeiros se forem gerenciados de modo inadequado. Isso ocorre pois a coleta dos dados pessoais aumenta de maneira significativa em plataformas de pagamentos digitais, incluindo transações, localização e comportamento de consumo.

O profissional também menciona que a Lei Geral de Proteção de Dados “apresenta uma série de direitos ao titular de dados e garante direitos para os consumidores afetados em caso de vazamento de dados devido a ataques cibernéticos”. O conhecimento desses direitos pelos consumidores é fundamental para reduzir a vulnerabilidade a práticas abusivas, permitindo que questionem as empresas em caso de descumprimento, contribuindo para um ambiente digital mais seguro e transparente.

Além disso, para aumentar a segurança dos usuários, o Banco Central implementou novas diretrizes para o Pix. Esse sistema de pagamentos passou a contar com regras adicionais desde o início de novembro, incluindo um valor limitado para as transferências realizadas a partir de novos aparelhos eletrônicos.

Nesses casos, o limite máximo de cada transferência financeira é de 200 reais, com um total diário de mil reais. O limite abrange exclusivamente novos dispositivos, porque nos que a conta já está vinculada, o funcionamento do Pix segue inalterado e vigora até que o usuário confirme a propriedade do novo aparelho eletrônico junto ao banco ou verifique a sua origem, com o objetivo de dificultar fraudes e golpes.

Dinheiro físico

Enquanto os pagamentos digitais conquistam a maior parte dos brasileiros, o dinheiro físico vem caindo em desuso e perdendo o seu protagonismo na economia de maneira inegável, mas ainda há quem prefira as cédulas de papel para manusear e guardar na carteira.

Lopes não acredita no fim iminente do dinheiro físico porque “uma parte significativa da população, especialmente os mais idosos e aqueles que possuem menor escolaridade, ainda preferem operar com dinheiro em espécie. No caso específico da realidade brasileira, existem muitos problemas relacionados à infraestrutura digital que acabam segregando pessoas sem muito acesso à internet e que moram onde é oferecida de maneira precária, dificultando o uso de serviços digitais e pagamentos online”. 

Com tantas alternativas de pagamento que a tecnologia oferece, alguns comércios preferem aceitar pagamentos online pela praticidade e falta de dinheiro físico para devolver o troco, já que a circulação das notas em papel está cada vez mais escassa.

Todavia, Campos alerta sobre essa prática, evidenciando que recusar pagamentos em dinheiro físico é considerado uma infração. “Os estabelecimentos comerciais no Brasil são obrigados a aceitar dinheiro físico como forma de pagamento e isso está previsto no Código de Defesa do Consumidor e na Lei das Contravenções Penais. Existem discussões e propostas legislativas que visam permitir que os comerciantes aceitem exclusivamente pagamentos eletrônicos, mas essas propostas ainda estão em tramitação e ainda não foram aprovadas”, esclarece o advogado.

O posicionamento do Brasil mundialmente

O relatório World Payments Report 2025 publicado pela empresa Capgemini constata que a Ásia Pacífico está destacada atualmente como uma das regiões de crescimento mais rápido para transações não monetárias no mundo.

Lucas Santos mora no Cazaquistão há quase um ano, país que faz parte da parcela da Ásia relatada na pesquisa, e ele compreende que o Brasil é muito beneficiado pelo Pix e é exemplo nas transações instantâneas, mas aponta que o país não possui uma boa infraestrutura como a dos países asiáticos. “Eu percebo que o Cazaquistão está mais bem desenvolvido que o Brasil no quesito da população estar mais acostumada e mais preparada aos meios digitais, tem a infraestrutura mais bem preparada, tanto da parte da população quanto dos estabelecimentos para poder utilizar meios digitais”, ressalta o brasileiro. 

Relacionado a esse contexto, o relatório da Capgemini reconhece o Brasil como referência mundial, devido à ampla adoção do Pix que continua atingindo novos recordes de utilização, sendo um exemplo do potencial dos pagamentos instantâneos.

Lopes confirma os desafios relacionados à infraestrutura enfrentados pelo país, mas reconhece que o território brasileiro está se destacando quando o assunto é economia digital. “Além do exemplo do Pix, Nubank e outros bancos digitais brasileiros também têm expandido as suas operações, alcançando uma parte cada vez maior da população, promovendo a inclusão financeira de quem antes não possuía acesso a serviços bancários tradicionais. Esses exemplos fazem com que o Brasil seja um dos países que mais avançaram na economia digital”, corrobora o professor. 

Incentivos para o crescimento da economia digital

Visando expandir a economia digital para facilitar a vida financeira e diminuir as burocracias, o governo brasileiro implementou algumas medidas estratégicas, como o pagamento digital nos transportes públicos. Em Brasília, desde julho deste ano, o pagamento das passagens de ônibus é realizado exclusivamente pelos meios digitais.

Essa novidade gerou resistência entre os usuários do transporte público, que contestaram a prática com base no Código de Defesa do Consumidor, conforme explicado por Campos durante a reportagem. O Centro Brasiliense de Defesa dos Direitos Humanos alegou em uma representação protocolar que isso exclui pessoas que possuem acesso a uma baixa infraestrutura digital. 

Outras cidades brasileiras, como Belo Horizonte e Campinas, também já adotaram os meios de pagamento digitais para acessar o transporte público. Embora os problemas ainda sejam significativos, a tecnologia e os meios digitais têm sido usados para democratizar o acesso aos serviços bancários e promover a inclusão financeira para milhares de brasileiros. 

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