Desconhecida por muitos, a superdotação exige atenção, estímulo e acolhimento desde a infância.
Julia Viana
A superdotação, ou altas habilidades, vai muito além de uma inteligência elevada. Segundo o Ministério da Educação (MEC), uma pessoa é considerada superdotada quando apresenta desempenho significativamente superior em áreas como raciocínio lógico, criatividade, liderança, talento artístico ou acadêmico. Esses indivíduos também costumam demonstrar uma capacidade de aprendizagem e resolução de problemas muito acima da média.
A psicóloga comportamental Regina Bérgamo, que atua há mais de uma década com crianças neurodivergentes, explica que as crianças superdotadas frequentemente apresentam um foco intenso quando interessadas, vocabulário sofisticado e sensibilidade emocional elevada. “Muitas vezes, são confundidas com crianças com TDAH por apresentarem comportamentos como desatenção seletiva ou agitação, mas a origem e a função desses comportamentos são diferentes”, explica.
Casos que impressionam
Recentemente, o Brasil se encantou com o “minidoutor” de apenas 5 anos que viralizou ao demonstrar conhecimentos profundos sobre o corpo humano. Mas esses casos não são tão raros quanto parecem, o que falta, muitas vezes, é visibilidade e diagnóstico adequado.
A história de Juliana, filha de Daiane Vieira, é um exemplo comovente e inspirador. Com um QI de 134, Juliana tem idade de 6 anos e habilidades cognitivas de uma criança de 8. “A professora notou que ela se destacava muito na sala de aula e nos orientou a buscar uma avaliação. O resultado confirmou a superdotação”, conta.
Apesar da descoberta, a jornada não foi simples. Juliana precisou enfrentar barreiras no sistema educacional. “Sugeriram o avanço escolar, mas não conseguimos por limitações legais. Chegamos a buscar uma escola particular, que também recusou por questões burocráticas. Agora ela está na escola municipal com atendimento individualizado”, relata a mãe.
Desafios e necessidades educacionais
A legislação brasileira prevê atendimento educacional especializado (AEE) para alunos com altas habilidades. No entanto, na prática, faltam profissionais capacitados, estrutura e, sobretudo, reconhecimento.
Regina Bérgamo aponta que as escolas ainda enfrentam dificuldades para lidar com esse perfil de aluno. “Muitas vezes, o sistema escolar não está preparado para estimular essas crianças, o que pode levar à desmotivação, isolamento ou comportamentos disruptivos”, afirma.
Juliana, por exemplo, demonstra desinteresse nas atividades escolares por já dominar os conteúdos. “Por isso, estamos em diálogo constante com a professora sobre o Plano Individual de Ensino, para que ela seja desafiada na medida certa”, explica Daiane.
O papel da sociedade e da família
O suporte familiar é um pilar fundamental e Daiane destaca que o incentivo da família e dos amigos foi essencial para o desenvolvimento da filha. “Sempre oferecemos materiais didáticos, brincadeiras educativas e, principalmente, muito apoio emocional”, conta.
Além disso, a psicóloga Regina reforça a importância de ensinar estratégias de autorregulação, oferecer ambientes com pares semelhantes e validar os sentimentos das crianças. “Superdotação não é só um dom, é também uma responsabilidade emocional e social que precisa de acompanhamento”, alerta.
Um futuro de possibilidades
Quando acolhidas e estimuladas de forma adequada, crianças superdotadas podem trilhar caminhos brilhantes. Mas isso só é possível com a união entre escola, família e políticas públicas eficientes.
É por isso que Daiane aconselha as mães a investirem na educação, passarem tempo de qualidade com seus filhos e procurarem conhecer os direitos deles. “A superdotação precisa ser mais falada, mais reconhecida. Não é um fardo, é uma oportunidade”, compartilha.
Enquanto ainda há muitos desafios, histórias como a de Juliana mostram que, com apoio e informação, é possível transformar a genialidade em potência real e oferecer um futuro mais justo e promissor para essas mentes brilhantes.