Saiba mais sobre doença que não permite controlar a vontade de comer.
Cristina Levano
Era o momento mais feliz na vida da Gilvanéia, ela estava a horas de ter sua filha nos braços, e depois de uma gestação tranquila, o prognóstico era positivo. Mas quando Agatha nasceu, tudo foi diferente do que tinha pensado, sua filha tinha desconforto respiratório e uma hipotonia severa (sem tônus muscular), porém , foi levada a UTI e teve que ficar internada por aproximadamente 100 dias no hospital.
Os primeiros meses foram difíceis para os pais da Agatha, pois não sabiam o que causava a hipotonia da sua filha. “Ela tinha entre 8 e 9 meses quando fechamos o diagnóstico, mas recentemente descobrimos que estava errado”, conta Gilvanéia.
Meses atrás (2022), uma geneticista revisou o laudo de Agatha e suas características, descobrindo um erro no laudo o que teria afetado o diagnóstico. “Ela se disponibilizou em resolver essa situação e nos ajudar, e quando nos passou o laudo retificado e certo, descobrimos que Agatha possuía a Síndrome de Prader-Willi”, relata.
Como parte da Semana Nacional da Pessoa com Deficiência Intelectual e Múltipla, a ABJ vai explicar um pouco mais sobre a Síndrome de Prader-Willi e seu tratamento.
O que é a Síndrome de Prader-Willi?
A síndrome de Prader-Willi (SPW) é uma doença genética que causa diminuição da força muscular, baixos níveis de hormônios sexuais e uma sensação constante de fome. Isso acontece porque a parte do cérebro que controla a saciedade ou a fome não funciona como deveria em pessoas com SPW, o que os torna propensos a obesidade, apneia de sono, entre outras doenças.
A endocrinóloga Vanessa Leão explica que “a doença é causada por uma alteração no cromossomo 15 e atinge uma a cada 30 mil crianças no mundo, seja menina ou menino”.
O diagnóstico é feito através de testes genéticos, nos quais se utiliza a análise da metilação do DNA ou por FISH. “Estes exames avaliam qual tipo de alteração cromossômica, se é deleção do cromossomo 15q11 paterno, se é dissomia materna ou se defeito no centro do imprinting,” explica a Dra. Leão.
Por ser uma doença genética, os sinais e sintomas variam de acordo com a pessoa e a idade da criança. Por exemplo, os bebês com síndrome de Prader-Willi geralmente apresentam tecidos frouxos, pouca força muscular, mas também podem ter:
- poucos movimentos dentro do útero;
- dificuldade de sucção e choro fraco nos primeiros meses;
- hipotonia: a diminuição da força e do tônus, o que pode provocar atraso no desenvolvimento dos bebês, como dificuldade para fazer alguns movimentos;
- alterações hormonais, que prejudicam o crescimento e desenvolvimento puberal;
- instabilidade emocional, excesso de raiva e teimosia;
- problemas cognitivos e comportamentais;
- hiperfagia: apetite em excesso.
Alguns destes sintomas, não se manifestam durante o nascimento, mas se desenvolvem com o tempo. A hiperfagia, que é o aumento de apetite, pode se apresentar depois dos 4 anos. Como cada indivíduo é diferente, o acompanhamento médico é essencial para o diagnóstico precoce e o manejo adequado do SPW.
Tratamento
Lamentavelmente não existe cura para esta doença, mas quem possui esta síndrome passa por terapia. De acordo com a Associação Médica Brasileira, a atividade física é importante, pois ao ter metabolismo reduzido pela redução de massa magra, os pacientes com SPW precisam ter uma dieta restritiva com intensa restrição energética para todas as idades. A atividade física diária de 1 a 2 horas por dia contribui com a melhora do gasto calórico e evita o ganho excessivo de peso. Ainda é necessária, uma abordagem comportamental e uso de hormônio de crescimento(somatropina).
A Dra. Vanessa Leão acrescenta que o trabalho mais importante de todos os médicos especializados em SPW é a educação. “Educar o paciente desde cedo sobre os alimentos que devem ser ingeridos, sobre os alimentos a serem evitados,” declara.
Os pais devem limitar o número de calorias ingeridas pelas crianças para prevenir a obesidade e as consequência que isso traz, fazendo um acompanhamento de perto do crescimento. A endocrinóloga recomenda que isso se realize através de uma rotina rígida de horários para não gerar ansiedade.
“É fundamental no tratamento (SPW) ter horários pré-determinados para se alimentar, não deixar os alimentos ao alcance da criança e não abrir exceções ou ceder à insistência da criança. Assim mesmo, iniciar o hormônio de crescimento o mais precoce possível para melhorar a hipotonia, o metabolismo, o crescimento e até a cognição,” finaliza a endocrinóloga.
Isso é exatamente o que os pais da Agatha tentam fazer todos os dias.
“Sempre foi um desejo nosso, mesmo antes dela nascer, conduzir ela a uma alimentação saudável e evitar ao máximo o contato com alimentos do tipo ultraprocessados,” narra Danilo Santos, pai da Agatha.
Hoje, Agatha tem 4 anos e está na fase mais crítica, pois neste período começa a desenvolver as compulsões alimentares. “Graças a Deus temos conseguido conduzir de uma forma em que não privamos ela de comer alguma “besteira”, para também não gerar algum trauma psicológico”, continua Danilo.
Como já conseguiram gerar nela o hábito de alimentação saudável, eles contam que não estão tendo grandes dificuldades, mas infelizmente temos relatos de famílias em que se faz necessário acorrentar armários e geladeiras para não serem assaltadas pelos próprios filhos. “Essa questão alimentar é tão importante quanto qualquer outra terapia que ela venha fazer, tendo em vista que tudo que irá consumir vai afetar de forma direta seu desenvolvimento”, explica o pai.
Uma só equipe
Existem muitos preconceitos sobre as limitações que a síndrome traz, como andar, falar, desenvolvimento intelectual das pessoas com SPW, entre outros pontos. Por isso, é importante manter-se informado, já que cada criança é diferente.
Por exemplo, de acordo com os pais da Agatha, ela tem uma ótima socialização no meio em que convive, seja na escola, igreja, etc. Ela ama abraçar, beijar, gosta de brincar com outras crianças, isso graças ao monitoramento e cuidado recebido por parte dos pais.
“Outra das características da síndrome é querer saber de todos os eventos que vai acontecer e isso causa nela uma ansiedade extrema, ao ponto de muitas vezes não falarmos para onde vamos, a não ser no dia ou a poucos minutos do evento. Caso contrário ela ficará perguntando e pensando como será, quem vai estar lá, com que roupa vai, etc,”, contam.
Danilo continua dizendo que “os desafios são inúmeros”, desde conseguir profissionais que lidam com esse tipo de síndrome, como acesso à informação precisa sobre o tratamento. Entretanto, atualmente já tem se disponibilizado uma grande fonte de informações através da SPW Brasil, uma associação que tem levado informações sobre o manejo da síndrome para pais e profissionais de saúde.
“Minha esposa faz parte de GP de WhatsApp com pais e mães do Brasil inteiro, no qual é disseminado muita informação e troca de experiência entre pais e profissionais. Isso está sendo de suma importância para todas as famílias,” acrescenta o pai de família.
O melhor jeito de acolher e apoiar as pessoas com SPW, é se informar, principalmente se são professores, médicos, vizinhos, que estão perto de alguém com a síndrome, mostrar empatia e livre julgamento.