Altas temperaturas não são a causa, mas influenciam, afirmam especialistas.
Gabrielle Ramos
O Brasil registrou um aumento de 78% de focos de incêndio entre 1º de janeiro e 26 de agosto deste ano, em comparação ao mesmo período do ano anterior. A Amazônia é o bioma mais impactado, concentrando 47% dos focos, de acordo com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).
Além das queimadas, o país enfrenta uma onda de calor e uma escassez de chuvas. Cerca de 75 cidades estão há mais de 100 dias sem precipitações, incluindo capitais como Palmas, Cuiabá, Brasília, Goiânia e Belo Horizonte. Ao todo, 12,5 milhões de pessoas são diretamente afetadas pela seca, segundo o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet).
Razões para os incêndios
A gestora ambiental e embaixadora do movimento Lixo Zero, Heli Martins, explica que o aumento expressivo dos focos de incêndio no último mês é resultado de um fenômeno complexo, influenciado tanto por fatores ambientais quanto por atividades criminosas.
Um dos fatores ambientais é o período de seca, comum em determinadas épocas do ano. “Isso favorece a propagação dos incêndios, especialmente em áreas como a Amazônia, o Cerrado e o Pantanal”, expõe a gestora.
No entanto, as mudanças climáticas agravam ainda mais essa situação. “As temperaturas estão cada vez mais altas em decorrência das alterações globais, o que cria um ambiente propício para queimadas mais intensas e mais frequentes”, afirma Karen Ribeiro, graduanda e pesquisadora em meteorologia.
As especialistas destacam que esse fenômeno gera um ciclo. Pois quando grandes áreas de floresta pegam fogo, uma enorme quantidade de gases de efeito estufa é liberada na atmosfera. Em contrapartida, o aumento das temperaturas contribui para a formação de novos focos de incêndio.
O crescimento desse índice também pode estar associado a atividades ilegais. “Trabalhei com monitoramento de queimadas em campo e encontrei incendiários, mas também é comum a prática de limpar o terreno com queima, que pode gerar incêndio em outros locais”, relata Leandro da Silva Gregorio, doutor em Geografia e ex-analista ambiental.
Heli Martins explica que essas ações são frequentemente realizadas por invasores de terras ou grandes grupos econômicos. “A ausência de fiscalização eficaz e a impunidade reforçam essas práticas criminosas, agravando ainda mais o problema”, destaca.
Altas temperaturas
As altas temperaturas no início de setembro são comuns, pois marcam a transição do inverno para a primavera. “O período de incidência solar é maior conforme nos aproximamos do equinócio de primavera, favorecendo ainda mais o aumento das temperaturas e a baixa umidade do ar”, explica Karen.
Entretanto, as mudanças climáticas globais, agravadas pelo aquecimento do planeta e por fenômenos como o El Niño e a Oscilação de Madden-Julian (OMJ), intensificam o calor nesse período. “Um dos fatores que contribui para isso é a atuação do anticiclone tropical do Atlântico Sul, que cria uma estabilidade atmosférica no centro do país e dificulta o avanço das frentes frias para o interior”, explica o doutor em Geografia.
Embora os incêndios não sejam a causa direta do aumento das temperaturas, eles contribuem indiretamente para o problema. “Quando perdemos florestas, estamos perdendo também um dos principais mecanismos de resfriamento natural do planeta, o que torna o clima local ainda mais quente e seco”, enfatiza a gestora ambiental.
Impacto
As queimadas afetam diretamente a agricultura e a pecuária, além de impactar o meio ambiente. “A destruição das florestas reduz a biodiversidade e afeta a oferta de recursos naturais, como a água e a fertilidade do solo, o que, a longo prazo, compromete a produção de alimentos e a segurança hídrica, principalmente em áreas rurais”, explica Heli Martins.
Além disso, a gestora ambiental reforça que o impacto das queimadas vai além do imediato. Pois é um efeito em cadeia que atinge milhões de brasileiros.