Brasil se torna o maior comprador de maconha medicinal da Colômbia

In Geral, Saúde

A venda de medicamentos à base da cannabis medicinal no Brasil teve um salto de 202%.

Isabella Maciel

Embora ainda carregue o estigma de ser uma droga ilícita, a maconha começa a ser vista por outro ângulo. Hoje, o Brasil se destaca como o maior comprador de cannabis medicinal da Colômbia, indicando uma mudança gradual na percepção e no uso da planta. O que levou a essa nova perspectiva? Como isso está afetando a vida dos pacientes que dependem desses medicamentos?

De acordo com a Associação Brasileira da Indústria de Canabinóides (BRCann), a venda de medicamentos à base da cannabis medicinal no Brasil teve um salto de 202% no primeiro trimestre de 2024, impulsionada por uma série de fatores, incluindo o crescimento da indústria e a ampliação do acesso por meio de importações e regulamentações mais favoráveis. 

Segundo a BRCann, o crescimento desse mercado regulado gerou a concorrência e o consumo local, resultando em uma redução contínua nos preços dos produtos de cannabis disponíveis nas farmácias do país. Houve uma queda de 25% no valor médio dos produtos nos últimos três anos.

A evolução do uso da maconha, foi de substância marginalizada a uma indústria em crescimento, está internamente ligada aos avanços científicos e às mudanças na percepção social. No passado, a cannabis era associada quase exclusivamente ao uso recreativo e à criminalidade. Hoje, pode ser vista como uma alternativa terapêutica viável para uma série de condições médicas, incluindo esclerose múltipla, fibromialgia, e epilepsia

A substância

A médica Wemilly Andrade explica que os componentes principais da cannabis, como o tetrahidrocanabinol (THC) e o canabidiol (CBD), substância química da Cannabis Sativa, atuam em receptores específicos do sistema endocanabinoide, que está envolvido na regulação de várias funções corporais, incluindo dor, humor, apetite e memória. 

Wemilly explica que “temos um sistema no corpo humano chamado sistema endocanabinoide (SEC). Esse sistema tem receptores na região cerebral, sistema digestivo, sistema imunológico, ossos, pele, em praticamente todo o corpo, e o objetivo desse sistema é manter a homeostase (equilíbrio do funcionamento corporal).”

Porém, a medicação é contra indicada para pacientes que possuam doença hepática, gravidez, reação psicótica/experiência ruim em uso prévio de cannabis, uso concomitante de varfarina.

Benefícios e malefícios

Os benefícios da cannabis medicinal são amplamente reconhecidos por pacientes e médicos, mas o uso da substância também levanta questões sobre os possíveis malefícios associados ao uso recreativo.

O óleo de CBD tem sido eficaz no tratamento de condições como autismo e epilepsia, estudos demonstram melhorias significativas na qualidade de vida dos pacientes. Além de ajudar no controle da dor, “melhora da qualidade” do sono, neuroproteção, e no tratamento de doenças como epilepsia (como a síndrome de Dravet e a síndrome de Lennox-Gastaut), autismo e fibromialgia.

Wemilly aponta que o uso de CBD em pacientes com autismo têm reduzido comportamentos desafiadores, melhorando a qualidade do sono e a interação social. A longo prazo, os impactos do CBD no desenvolvimento cognitivo e psicomotor das crianças são promissores. 

Os malefícios ainda não são totalmente compreendidos, no entanto, ela alerta que como qualquer substância, o CBD pode ter efeitos colaterais, como aumento do sono, sensação de boca seca e náuseas.

Somente em casos específicos, e em poucos países, o uso medicinal da maconha é liberado, pois ela também pode causar amnésia, falta de atenção, soltar o intestino, náuseas, problemas motores, gerar dependência e crises de abstinência. A longo prazo, seu uso pode trazer complicações mais graves como esquizofrenia e danos cerebrais permanentes.

Avanço no uso da maconha medicinal

Wemilly explica que a reação da comunidade médica com o uso do CBD para tratamentos neurológicos é um misto de interesse, entusiasmo e ceticismo. Ainda há muitas barreiras e preconceitos que precisam ser desmistificados. “Não existe ainda um consenso, a comunidade médica está cada vez mais aberta ao potencial do CBD, mas a reação é equilibrada com a necessidade de mais evidências científicas e uma abordagem cuidadosa em relação à regulamentação e à qualidade do produto”, frisa a neurologista.

A história de Charlotte, uma menina de cinco anos nos EUA com Síndrome de Dravet, é um exemplo do impacto positivo do CBD. Charlotte sofria até 50 crises tônico-clônicas generalizadas por dia. Mas após três meses de tratamento utilizando extrato de Cannabis com alto teor de CBD, suas convulsões reduziram em mais de 90%. 

Porém, o CBD não supera outras drogas comumente utilizadas para esses tipos de epilepsia, sendo apenas um medicamento complementar disponível contra essas formas graves de epilepsia, em alguns casos oferecendo grandes benefícios.

Um estudo realizado nos Estados Unidos com 108 crianças com epilepsia mostrou que 29% delas tiveram uma redução de 50% nas convulsões após seis meses de uso de óleo de CBD, e 10% não tiveram mais convulsões.

Taciana Oliveira, mãe de Pedro, um menino autista que faz uso de óleo de CBD, conta que a fala foi a principal mudança. “Ele quase não falava, hoje já se comunica bem melhor! Ansiedade, seletividade alimentar, tudo melhorou”, relata.

Taciana explica que já conhecia o tratamento terapêutico através do óleo de CBD antes mesmo de ter filho. “Então um tempo atrás decidi usar pelos inúmeros relatos positivos de pessoas autistas que usam”, explica.

“Se realmente tem vontade de usar, procure um profissional adequado para a avaliação minuciosa! Não se prenda a ideias de preconceitos, pois não é aquela droga, é apenas uma substância terapêutica extraída da mesma planta”, aconselha Taciana.

Dificuldades

No Brasil, pacientes enfrentam desafios legais significativos ao buscar tratamento com cannabis medicinal. Segundo o advogado Clayton Medeiros um dos principais desafios encontrados pelos pacientes é o alto custo do medicamento à base de cannabis. “Ainda não temos um tratamento totalmente acessível quando falamos de medicamentos importados”, explica Clayton. 

Ele também destaca que o cultivo de cannabis com fins medicinais ainda não é reconhecido pelo Estado brasileiro, precisando o paciente se socorrer ao Habeas Corpus de cultivo de cannabis para ter a sua liberdade e o seu remédio caseiro resguardados.

O processo de obtenção de autorização judicial para o uso da maconha medicinal no Brasil é complexo e burocrático, exigindo documentação robusta, incluindo prescrição médica, laudo médico, autorização de importação pela Anvisa, e cursos de cultivo e extração de cannabis. 

Apesar dos desafios, a crescente aceitação da maconha medicinal no Brasil reflete uma mudança cultural e legislativa. Há um número crescente de leis estaduais e municipais que permitem a distribuição de medicamentos à base de cannabis pelo SUS, embora ainda existam limitações quanto às patologias cobertas. 

Clayton explica que o Brasil já regulamentou o uso de THC a nível federal para uso medicinal, enquanto nos EUA, a regulamentação depende das políticas estaduais.

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