São os atos do dia-a-dia que definem o caráter, e, também, a deselegância
Maria Teófilo
Em 13 de novembro foi comemorado o Dia Mundial da Gentileza. A ideia de criar essa data surgiu em 1996, em uma conferência que reuniu grupos de vários países em Tóquio com o objetivo de expandir o conceito pelo mundo. Somente no ano 2000 o movimento “World Kindness Day” (Dia da Gentileza) foi oficialmente criado com a intenção de inspirar pessoas a criarem um mundo mais gentil.
Atitudes inspiradoras que transformam
O que entendemos como gentileza? Ao falar de uma perspectiva brasileira, ela nos ajuda com o diálogo. Claro que, no dia-a-dia, as questões práticas não são tão objetivas ou eficazes como esperamos. Mesmo assim, existem estudos na área das Ciências Sociais que sugerem a “transmissão da gentileza” como um comportamento repetido, além de ajudar no bem-estar físico das pessoas. Desse modo, são os atos diários que definem o caráter, e, também, a deselegância. Há de se lembrar da clássica frase popular “gentileza gera gentileza”. Ela foi criada por José Datrino, um andarilho que viveu por 40 anos nas ruas do Rio de Janeiro, e ficou conhecido como “Profeta Gentileza”.
A antropóloga Evelize Moreira acredita que, “se pensarmos não apenas no contexto do nosso país, mas do mesmo modo em diversos outros, temos vivido momentos de atitudes polarizadas em diferentes escalas e esferas, sobretudo quando se têm as redes sociais como ‘abrigo’ para se dizer e esbravejar tudo o que pensamos”. Segundo a pesquisadora, neste sentido, a gentileza como estratégia de socialização ajuda não apenas na coesão de um grupo, mas também no desenvolvimento do que, antropologicamente, chamamos de alteridade: o ato de colocar-se no lugar do outro, respeitando espaços e agindo com respeito ao próximo. Atitudes como um cumprimento, um abraço, um sorriso ou uma palavra positiva são capazes de mudar o dia de uma pessoa que está mal. Em diversas sociedades e/ou organizações, atritos fazem parte da construção das diferenças, e a gentileza também deve ser inclusa no processo.
Estimular a gentileza entre as pessoas
Celma Gomes, coordenadora técnica da “Casa de Acolhida”, em Mogi Guaçu (SP), fala da importância da gentileza em um ambiente que acolhe moradores de rua. “Nosso trabalho é estimular os acolhidos a terem uma vida digna e a voltarem para sociedade. Ser gentil com essas pessoas é fundamental. Se eu não for gentil, jamais estabelecerei um vínculo com nossos usuários”, alega a líder. A coordenadora ainda menciona que a prática dessa amabilidade faz bem para as pessoas, já que tratar com delicadeza o próximo aumenta as chances de uma retribuição carinhosa e afetuosa.
Por mais que tais atitudes pareçam universalmente bondosas, não podemos afirmar que existem grupos sociais mais gentis do que outros. De acordo com Moreira, ao pensarmos culturalmente nas diferenças, o que é gentileza e o que é ser gentil pode ser interpretado e considerado de formas múltiplas para diversas sociedades, ou, até mesmo, dentro de um mesmo grupo. Um exemplo é a Teranga, que faz parte da sociedade senegalesa. Esse grupo é o foco de estudos da antropóloga há 2 anos. O termo, que não possui tradução literal para o português, é como uma força hospitaleira que move os senegaleses. “As ações destas pessoas podem ser vistas como gentileza: você deve tratar o próximo com muito respeito, oferecer tudo o que tem e convidá-lo para partilhar o seu alimento”, aponta a pesquisadora. A Teranga senegalesa é um conjunto de atitudes que nos ajudam a compreender muitos dos desdobramentos da “hospitalidade” ou “gentileza” como marca de uma sociedade. No caso dos senegaleses, isso serviu como coerção que influenciou diretamente nas identidades do povo, e que fez com que o Senegal fosse conhecido como o “país da Teranga“. Até o futebol não foge da prática: um de seus times se chama, em português, “Leões da Teranga“.
Abrir mão da gentileza?
Marcia Lucas é capelã no Unasp Engenheiro Coelho. Ela define gentileza como a característica de alguém que é amável, delicado/a nos relacionamentos e se preocupa com outros. A capelã também adverte que ser “bonzinho” e gentil são coisas diferentes. “Ser bonzinho, muitas vezes, é ter a síndrome do capacho: ‘podem pisar em mim, eu não falo nada, nunca abro a boca ou digo não’. Ser gentil não é assim: é ter voz, é impor limites”, frisa Marcia. Ela acredita que, embora todos os seres humanos sejam limitados, podemos ver em Deus a personificação da gentileza. Por isso mesmo, ao vermos outras pessoas – também criadas e amadas por Ele –, devemos agir de forma respeitosa e carinhosa, “porque é uma vida e é preciosa”.
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