Traumas e desigualdade aumentam doenças neurológicas em mulheres

In Geral, Saúde

Especialistas apontam que situações ao longo da vida e sobrecarga interferem mais na vida das mulheres do que dos homens.

Sara Helane

Traumas e desigualdades desde a infância podem causar doenças não só físicas, mas também neurológicas em mulheres, de acordo com psicólogos e especialistas. A ansiedade está entre as patologias neurológicas que mais afetam elas.

Essas doenças psicológicas podem desenvolver inseguranças na autoestima, criar crença de perfeccionismo por medo de errar, além de, em casos mais graves, levá-las à idealizações de atentado contra a própria vida. Com isso, psicólogos alertam para as vítimas buscarem ajuda o quanto antes.

Traumas

A psicóloga especialista em atendimento feminino Adriana Dias de Oliveira explica que o trauma é um evento inesperado e inimaginável de um acontecimento, que pode trazer sequelas para pessoa a vida inteira, mesmo que guardadas inconscientemente. “Um trauma psicológico pode deixar feridas emocionais numa determinada pessoa dependendo da intensidade de cada um, da subjetividade de cada um”, explica.

Adriana ainda ressalta que situações traumáticas interferem muito na vida das mulheres, mais até do que nos homens, por conta da sobrecarga que têm diante da sociedade em si. “A mulher é ensinada a dar conta de tudo, ensinada a engolir o choro e isso pode ocasionar muitos problemas e doenças neurológicas”, alerta.

Consequências de desigualdades e traumas

Adriana conta que uma de suas pacientes teve um Acidente Vascular Cerebral (AVC) hemorrágico em consequência de traumas. A psicóloga ainda fala que a paciente aguentou muito tempo um casamento que não deu certo, e abusos, tanto físicos como emocionais, causados por pessoas próximas. “Ela sempre foi rejeitada pela mãe e ao longo dos anos foi engolindo e aguentando, até que em 2022 ela teve um AVC hemorrágico de origem emocional”, relata.  

Thamiris Oliveira é psicóloga clínica focada no tratamento de transtornos ansiosos em mulheres e conta que esse grupo representa o maior número de casos de transtorno de ansiedade. Ela ainda explica que não existe ainda nenhum estudo científico que investigue se há algo no cérebro das mulheres que propicie esses transtornos, que tenha algo a ver sobre a formação do cérebro feminino e se isso impacta elas com relação à ansiedade. “Por outro lado, se olharmos o fator social, fica claro o porquê as mulheres sofrem mais com isso, por conta da desigualdade também”, enfatiza. 

Para Thamiris, ao pensar em traumas e desigualdades, é necessário levar em consideração que o número de abusos é maior em mulheres e as taxas de feminicídio crescem a cada dia. “O  ambiente físico pra mulher também é mais perigoso, o que coloca o cérebro dela sempre em alerta”, destaca.

Uma pessoa sempre em estado de alerta, aumenta o nível de adrenalina e cortisol (hormônio do estresse), pode desenvolver uma imunidade baixa e outros tipos de doença.

Ansiedade

Thamiris ressalta que uma das principais consequências que os traumas podem causar é a ansiedade e que ela pode impactar na visão que essas mulheres têm de si mesmas, ou seja, na autoestima. Ao terem a autoestima afetada, as mulheres têm pouca confiança em si mesmas e isso pode ser um fator que atrapalhe muitas ocasiões na vida como: ao entrar no mercado de trabalho, ao serem mães ou começar um relacionamento.

“Isso acaba trazendo consequências sociais por conta da cobrança excessiva por medo de errar, e como um dos mecanismos das ansiedade é a fuga, a mulher acaba não entrando em algumas situações”, diz.

Outro trauma que pode causar doenças neurológicas em mulheres é o abuso, tanto psicológico, como físico. “Por exemplo, uma mulher que é abusada sexualmente, ela pode desenvolver diversas crenças de culpa ao longo da vida, ela pode se sentir culpada pelo abuso, e essa culpa pode desencadear transtorno de ansiedade”, diz Thamiris. Ela ainda ressalta que isso pode ocasionar medo de socialização, medo de formar uma família e medo de homens também. 

Tipos de ajuda

Adriana diz que o tipo de ajuda que as mulheres que desenvolveram transtornos mentais em decorrência de traumas, precisam buscar é a terapia, praticar exercícios físicos, ter um “dia do nada”, ou seja, “nada pros outros e tudo pra mim”.

A psicóloga ainda alerta sobre quando se deve procurar acompanhamento. “Buscar ajuda o quanto antes ou quando não estiver suportando sozinha, quando não estiver bem comigo mesma, quando estiver tendo uma crise de ansiedade ou tendo características de depressão”, enfatiza.

Thamiris diz que mulheres que sofreram qualquer tipo de abuso devem procurar ajuda psicológica e/ou psiquiátrica para tratar as feridas que podem ter ficado após o acontecimento, para que ele não desenvolva ali o transtorno de ansiedade, fobia social ou até um transtorno de estresse pós-traumático. “É importante que se busque ajuda logo após esses abusos ou quando se percebe esses sintomas de estado de alerta, medo e perfeccionismo”, aponta.

A assistente social Gabriela Elias diz que existem algumas políticas públicas que são ofertadas para mulheres que estão fragilizadas. Gabriela conta que existem os Centros de Referência da Mulher, que são espaços que atendem mulheres em diversas políticas. Além disso, existe o Centro de Referência Especializado da Assistência Social (Creas) que oferece acompanhamento especializado para pessoas vítimas de violência. 

Em relação aos traumas, as mulheres podem estar buscando as unidades básicas de referência para poder iniciar algum acompanhamento, ou ser encaminhadas para algum processo terapêutico. Dentro do Sistema Único de Saúde (SUS) isso é ofertado e a partir disso vai ser compreendido qual é o melhor tratamento e acompanhamento que a mulher irá realizar no campo da saúde mental.

A assistente social enfatiza que quando se trata de uma questão de risco para a vida das mulheres, existem serviços de acolhimento institucional para vítimas de violência e suas famílias, que visam garantir sua proteção. “São espaços que vão possibilitar que a mulher vá com seus filhos, para que, tanto elas como as crianças, sejam protegidos e para que não haja uma separação entre mães e filhos em situação de violência doméstica”, conta.

Sobre a atuação do assistente social, Gabriela diz que o profissional é um viabilizador de direitos, que tem a possibilidade de passar informações e orientações, de fazer encaminhamentos e articular, como a rede de políticas sociais para que essas mulheres tenham seus direitos garantidos. “O assistente social vai trabalhar na inserção das mulheres dentro de serviços, programas, projetos e benefícios do estado, a fim de que essas mulheres consigam tratar seus traumas em outros espaços de saúde mental”, completa.

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