Em meio aos obstáculos da vida, Luciana lutou bravamente por um futuro melhor.
Bruno Sousa Gomes
Ah, meu Deus, que cheirinho bom! O cheirinho de café passado na hora podia se sentir de longe, e o aroma do pão de queijo bem assadinho, saindo do forno. Hmmmmm! Que delícia! Sério, que tempinho bom! Luciana Costa, mulher guerreira, determinada e que luta com um belo sorriso no rosto, entrou em uma ligação comigo. Era por volta das 14h da tarde de domingo, quando aquelas bochechas avermelhadas e uma expressão meiga saudosa atendeu a vídeo chamada.
A vida para Luciana nunca foi tão fácil. Nasceu na pequena cidade de Campos do Jordão, no interior de São Paulo. Por lá ela cresceu. De família muito humilde, sem muitas condições financeiras e sem conhecer o próprio pai, o qual sumiu após a suspeita de gravidez da sua mãe, ela sempre olhou para as dificuldades de forma diferente.
Sonhando com uma vida melhor, desde os seus 14 anos, intercalava seus estudos na escola pública com o trabalho, que contribuía para ajudar nas despesas de casa. Uma de suas duas irmãs sempre foi fonte de inspiração para ela, mas já com a caçula, infelizmente o relacionamento não era dos melhores. “Minha irmã tem problemas mentais”, afirma.
Nessa época, Luciana foi morar com a irmã mais velha por conta dos atritos que persistiam entre ela e a irmã caçula. Durante o dia ela trabalhava cuidando dos seus sobrinhos e à noite estudava. Dois anos se passaram e ela voltou para casa da mãe e do padrasto. Com um sorriso de orelha a orelha, ela entende que foi necessário ter ido passar esse tempo fora. “Eu amadureci”.
A enchente
Instantaneamente, como num piscar de olhos, o sorriso que estava escancarado no rosto de Luciana se desmancha. Não contendo a emoção, ela começa a chorar ao lembrar dos momentos duros e difíceis que viveu no verão de 2000. Campos do Jordão viveu dias de horror quando começou a chover muito. A pequena nuvem carregada se tornou uma tempestade sem fim. Campos foi uma das cidades mais atingidas, deixando mais de mil mortos e dezenas desabrigados.
Luciana relata ter perdido tudo com o fenômeno. Aquele dia cinzento e úmido nunca mais saiu da sua memória. Sua mãe e ela precisaram se mudar para um barraco de madeirite, feito de raspa de madeira, o qual, no momento, era o único lugar que tinham para morar. “Era tudo tão pequeno, fazia muito frio e quando chovia molhava tudo”, relembra. As lágrimas escorriam de seus olhos, mas não tinha outra alternativa, a não ser viver ali.
Apesar de todo sofrimento, mãe e filha aproveitaram a situação do desastre para se reerguer. E relembra a união da população para ajudar quem estava passando por aquele momento de turbulência. Inclusive, o governo de São Paulo criou um projeto para ajudar quem perdeu seus lares, o Condomínio Habitacional Urbano Popular do Povo (CDHU). Existe até hoje, onde sua mãe, Ondina, residia um ano atrás lá em Campos.
No período que moravam no barraco de madeirite, Luciana e dona Ondina arrumaram emprego em uma lanchonete. Lu voltou a cuidar de crianças e sua mãe trabalhava muito para suprir as despesas. Do total que ganhavam, uma parte era guardado. Por isso, após a criação do projeto, Dona Ondina teve recursos suficientes para reformar o apartamento que a foi contemplado.
Começo de um sonho
A partir daí a vida de Luciana começou a melhorar. Aos 24 anos, trabalhava em uma loja de malha, lugar em que conheceu André (nome fictício) seu colega de trabalho. Ela conta que o seu coração palpitava, seus olhos brilhavam toda vez que via aquele rapaz. Luciana vivia o seu primeiro amor, entre risos envergonhados se abria para esse romance. Durante seis anos ela viveu bons momentos com ele, até descobrir uma traição que a fez terminar.
Porém, André foi uma influência positiva, em certo ponto, na vida de Luciana: a incentivou a estudar. Ela sempre foi apaixonada pela área da saúde, mas não sabia ao certo em que se especializar. Decidiu cursar Fisioterapia. Com o decorrer do tempo, ela percebeu que aquilo não era bem o que queria, “entrei em estado de choque”, enfatiza Lu. Assim, desistiu do curso e começou outro.
Optou por Letras, uma vez que gosta de crianças e de ensinar. Tudo parecia perfeito, até que chegou a época das aulas práticas, ela descreve que não foi o que esperava. Tomou a decisão de continuar, já que haviam passado três anos de curso, não valeria a pena parar. Então, concluiu o curso e foi trabalhar em outro ramo.
Luciana foi trabalhar de camareira em um hotel. Ganhava bem. Além de conseguir fazer um curso de inglês. Ah, se o telefone transmitisse emoções…eu poderia sentir de perto o que ela queria passar com seu carisma como uma mulher vitoriosa, por estar tendo a oportunidade de contar a sua história. Bom, ela se destacou na empresa que foi promovida para um cargo de supervisora das camareiras. Ela ganhava mais com a promoção e trabalhava das 15h da tarde até às 23h da noite.
Luciana podia dizer que estava em uma boa fase, mas a sua rotina era muito corrida, com a expressão de indignação, disse: “cara, eu não tinha vida”.
Outra paixão
Depois de quatro anos de empresa, decidiu parar. Nesse momento, Luciana voltou para a sala de aula. O inesperado acontece: João (nome fictício) chega na sua vida. Ele trabalhava no almoxarifado da escola. Entre troca de olhares e sorrisos bobos nasce um grande amor. Mas será mesmo que era um grande amor?
Bom, ao todo foram sete anos de relacionamento, quatro de namoro e três de casamento. No começo eram tudo flores, mil maravilhas. Durante os quatro anos de namoro era como se estivesse vivendo num conto de fadas do mundo Disney. Uma sensação prazerosa que lhe enchia a boca para falar por essas experiências tão boas, ela decide se casar com ele.
Após o casamento, foi horrível. João se transformou em um homem completamente diferente do que ela havia se apaixonado. Nesse momento, o olhar de Luciana transmitia raiva, se podia sentir mesmo por ligação a mágoa que ainda lhe incomoda por alguém que a fez sofrer tanto, a pessoa que tentou apagar o seu brilho. Para ele, Lu devia viver em sua função. “Machista”, conta ela.
Além de dar aulas, ela fazia massagens para ganhar um extra e as pessoas diziam que ela tinha dom para aquilo. Mas como se dedicar a algo enquanto vivia um relacionamento tão abusivo? Era difícil! Eles tentaram ter filhos, fizeram até tratamento, mas o marido alegava que o problema estava nela. Sendo humilhada, trabalhando muito para ajudar em casa, Luciana não desistiu.
Ser perseverante
Ela ergueu a cabeça e continuou a lutar, viu que tinha dom para fazer massagem e foi estudar. Na época, através do ENEM, quem fosse bem na redação ia ganhar uma bolsa 100% para cursar massagem e estética. Luciana estudou muito e a aprovação veio. Mas João não queria ver a felicidade dela, aquilo o enchia de ódio e ele a humilhava cada vez mais.
O abuso mental foi tão grande que foi preciso procurar tratamento psicológico, ela disse: “eu pensava que o problema era eu”. Quem pode suportar tamanha humilhação? Nessa época os problemas mentais vieram como: depressão, síndrome do pânico, crise de ansiedade. Apesar de tudo, Luciana foi adiante, não parou, estudava massagem, estética e dava aulas.
Com a terapia foi entendendo que o problema era ele e foi encontrando forças para lutar e sair daquele relacionamento tóxico que queria enterrar os seus sonhos. Cada vez mais Luciana se apaixonava pelo o que estava fazendo. Realmente havia se encontrado. Estética e massagem se tornaram sua paixão. Como estava crescendo, sentiu a necessidade de abrir seu próprio consultório, na garagem de casa, iniciando o atendimento aos seus clientes.
Isso foi o auge para João, então ela decidiu largar tudo e alugar um local. Assim, arrumou coragem e se separou dele. Levou somente alguns móveis e até hoje luta na justiça para receber a parte dela na separação dos bens.
A chegada de Noah
Já faz seis anos que Luciana tem o seu consultório e está muito feliz, embora continue estudando para se aprimorar e acompanhar o avanço do mercado de trabalho. A novidade é que, após seis meses depois do último relacionamento, encontrou pelo Tinder o Pedro (nome fictício) , ela deu gargalhadas, podia ser carência quem sabe. Eles namoraram por 8 meses e tiveram o Noah. Quando ele soube da gravidez foi embora.
Luciana quase viveu a mesma coisa com João. Ele queria conforto e a traía. Eles até voltaram no final da gravidez. Mas, não deu certo. Hoje Noah tem onze meses, e Pedro, o pai, ajuda pouco.
Era por volta das 15h e Luciana se despediu com sentimento de gratidão, pois as pessoas iriam conhecer um pouquinho dela e a sua história, pode sim, servir de inspiração para as pessoas que passaram pela mesma situação.
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