De acordo com um estudo feito pela Universidade de Brasília (UnB), em 2010, 800 mil mulheres escolhem abortar
Thamiris Senis
Uma ação que pede a legalização ampla do aborto para qualquer gestação com até 12 semanas chegou ao Supremo Tribunal Federal (STF). A ação foi protocolada há duas semanas. Hoje em dia, no Brasil, a interrupção da gravidez só é permitida caso a mulher corra risco de morte, se a fecundação ocorreu por estupro ou se o feto é anencéfalo (sem cérebro). Nas demais situações, a mulher que escolhe abortar pode ser presa por até três anos e os médicos responsáveis pelos procedimentos podem ser condenados até quatro anos.
Mas mesmo com todas as punições, o aborto no Brasil não deixa de ser uma realidade constante. De acordo com um estudo feito pela Universidade de Brasília (UnB), em 2010, 800 mil mulheres escolhem abortar. E quem são essas mulheres? Segundo uma estimativa feita pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estítica (IBGE), as brasileiras têm entre 18 e 49 anos. A maioria delas moram em zona urbana e têm ensino superior incompleto ou o ensino fundamental. Ao todo somam 1.068 milhão de abortos. Apesar da grandeza desse número, a legalização geral do aborto ainda é atualmente um dos temas mais polêmicos para discussões no país.
Para o sociólogo Frederico Cesarino, a noção do aborto como crime surgiu, sobretudo, a partir da religião. “Considerando que as leis comuns são geralmente advindas dos costumes sociais e estes costumes são muito baseados nas orientações religiosas, podemos entender que a condenação pública é bastante baseada na religião”, argumenta.
Frederico também atenta para o fato de que, se o aborto fosse determinado como algo legal, o número não reduziria, mas, por outro lado, o número de mulheres mortas ou hospitalizadas por complicações no procedimento seria consideravelmente menor. “Com o aborto estabelecido legalmente, pelo menos seria reduzido o número de mães mortas ao fazerem o procedimento, uma vez que este seria realizado em condições sanitárias melhores”, constata.
Felizmente, a jovem Milena Santos não entrou para as estatísticas mais trágicas. “Eu não queria ter um filho naquela época. Meus pais não aceitariam e eu ia ter que desistir do ensino médio”, desabafou. Essa é a atual realidade de muitas como Milena, que hoje tem 22 anos e admite não ter se arrependido de optar pelo aborto. Quando questionada sobre como foi o procedimento, a moça conta que soube da gravidez bem no início e por isso achou que seria fácil apenas tomar um remédio que conseguiu comprar na farmácia do bairro. Sem orientação da família e sendo constantemente pressionada pelo namorado, não viu outra saída a não ser acabar logo com o “sofrimento”. Entretanto, era só o princípio das dores. “Eu joguei o bebê na privada da minha escola e dei descarga. Alguns pedacinhos ainda ficaram em mim e eu tive que tirar com a mão”, expõe.
A jovem garante que o sofrimento foi absurdo. Depois de duas horas que havia tomado os três comprimidos que precisava, começou a sentir uma dor muito forte no estômago e uma queimação estranha na vagina. “Corri para o banheiro e logo vi que eu estava sangrando muito. Eu queria gritar de tanta dor. Não conseguia me mexer e nem podia chamar ninguém para me ajudar”, lembra. Milena passou quatro horas no banheiro e, quando finalmente tudo acabou, ela se sentia muito fraca para andar sozinha até sua casa. Hoje ela diz que tudo não passa de uma lembrança horrível que não divide com ninguém e em sua defesa alega: “Eu estava muito desesperada”.
Em 2013, foram mais de 150 mil casos de mulheres internadas por complicações em abortos induzidos no país, segundo dados de um estudo da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ). “Aborto já é livre no Brasil. Proibir é punir quem não tem dinheiro”, diz Dráuzio Varella
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