Experiência cultural, vantagem financeira e modelo de trabalho flexível estão entre as principais motivações para buscar trabalho no exterior.
Gabrielle Ramos
O Brasil ocupa a quinta posição entre os países com mais trabalhadores contratados por empresas internacionais. De acordo com o Relatório Global de Contratações Internacionais 2024, elaborado pela Deel, o país registrou um crescimento de 53% nesse tipo de contratação, consolidando-se como um dos principais polos de mão de obra qualificada no mundo.
O especialista em liderança e recursos humanos, Richard Heiras, destaca que um dos grandes diferenciais dos profissionais brasileiros é a criatividade, aliada à capacidade de adaptação a diferentes modelos de trabalho e a qualidade das entregas.
Busca pela internacionalização
Após a pandemia, Gabriel Schaefer, profissional da área de Gestão e Tecnologia da Informação, percebeu que o home office havia se consolidado e decidiu buscar oportunidades em empresas internacionais. “Em menos de três meses, comecei a receber propostas de empresas de fora e, pouco tempo depois, fechei com a empresa onde trabalho até hoje”, conta.
Para Ana Marques, formada em Publicidade e Propaganda com especialização em Marketing Digital, a motivação foi semelhante. Ela buscava uma oportunidade que lhe permitisse flexibilidade para viajar, já que mantinha um relacionamento com um holandês. Com experiência em uma empresa multinacional, conseguiu uma oportunidade remota em uma empresa britânica.
Mas não é apenas pela possibilidade de trabalhar a distância que os brasileiros estão buscando espaço em empresas internacionais. Esse é o caso da jornalista Zilá Motta, pós-graduada e mestranda em Marketing. Após experiências como au pair nos Estados Unidos, ela se candidatou a diversos estágios e conseguiu uma vaga em Londres, onde vive e trabalha até hoje. “Gosto dessa troca cultural, de morar fora, de ter a possibilidade de viajar, conhecer gente nova e, principalmente, ganhar em moeda forte”, afirma.
Vantagem monetária
Segundo o relatório, os salários pagos a profissionais brasileiros no exterior aumentaram 4% no último ano. Esse crescimento, somado à valorização de outras moedas em relação ao real, é um dos principais motivadores para a busca por oportunidades internacionais.
A jornalista compartilha que, mesmo como estagiária em Londres, conseguia manter um padrão de vida melhor do que teria no Brasil. “Não consigo me ver mais ganhando em real”, comenta ao lembrar que, durante um período em que trabalhou remotamente do Brasil para uma empresa estrangeira, sentia o impacto dos preços mais altos no dia a dia.
Para Gabriel Schaefer, receber em outra moeda é uma forma de garantir mais estabilidade e qualidade de vida. “Além do poder de compra ser superior, o dólar é uma moeda mais estável. Quando os preços sobem no Brasil, o dólar geralmente se valoriza, mantendo meu salário mais protegido contra a inflação”, afirma.
Diferenças entre os mercados
Heiras explica que, no exterior, a cultura de gestão não se baseia em poder e controle, mas sim em resultados. “Alguns profissionais têm dificuldade com mercado internacional, pois esquecem que com a liberdade e autonomia o nível de responsabilidade aumenta e muito, principalmente em relação aos prazos e qualidade das entregas”, afirma.
Essa diferença é percebida pelos brasileiros que trabalham para empresas estrangeiras. “Nós, brasileiros, somos mais comunicativos, detalhistas e, muitas vezes, levamos questões profissionais para o lado pessoal. Já estrangeiros, especialmente norte-americanos e canadenses, são diretos e objetivos”, analisa Gabriel.
Além disso, Zilá ressalta que nesse contexto o que realmente importa não é onde o profissional se formou, mas sim sua experiência e capacidade de executar o trabalho com precisão. “Aqui eles não têm muita paciência para erros”, relata.
Apesar dessa pressão, as comunicadoras observam uma diferença na relação entre vida pessoal e trabalho. “Eles requerem que você trabalhe e entregue, mas na mesma medida, são muito flexíveis para você ter tempo para viver, tirar as suas folgas”, destaca a publicitária.
Áreas e geração de destaque
Dados da pesquisa informam que a área de tecnologia é uma das mais valorizadas no mercado de trabalho internacional. Profissões como engenharia de software lideram o ranking de profissionais que receberam os maiores aumentos salariais no último ano.
Outro destaque está na faixa etária dos contratados. A Geração Z registrou um crescimento de 98% nas contratações internacionais. O especialista em liderança e recursos humanos explica que esse fenômeno ocorre porque essa geração tem mais acesso e familiaridade com as tecnologias de mercado.
No entanto, ressalta que a idade não é o fator determinante, e sim o nível de atualização do profissional. “Muitos profissionais que se atualizam tecnicamente têm oportunidades internacionais”, complementa.
Nem tudo são flores
A jornalista ressalta que, apesar das várias qualidades dos profissionais brasileiros, o verdadeiro motivo das contratações por empresas estrangeiras não é o interesse em talentos internacionais, mas sim o custo mais baixo da mão de obra em comparação com as contratações no próprio país.
Heiras explica que, para as empresas, essa abordagem representa um atrativo em termos de investimento financeiro versus resultados. “Não é tão caro, mas a entrega é de alta qualidade”, afirma.
Apesar disso, essa realidade acaba se tornando uma oportunidade para muitos brasileiros, especialmente devido à desvalorização da moeda nacional. “Mesmo que não seja o salário mínimo do Reino Unido, para mim, morando no Brasil, vale super a pena e consegue ser maior do que a faixa”, compartilha Ana.