A ocorrência de crimes existem e devem ser julgados, mas não generalizados.
Nátaly Nunes
O caso de doze alunos que foram expulsos da faculdade em março de 2025 repercutiu nas redes sociais. O motivo: uso de frases com apologia ao estupro em jogos universitários. Enquanto a bola estava rolando em quadra, a competição de xingamentos, falas preconceituosas e agressivas na arquibancada parecia ser mais forte.
As competições esportivas organizadas para estudantes universitários são eventos muito esperados pelos alunos de várias faculdades. Eles se prepararam durante o ano para esse momento de diversão que acontece no ambiente de estudos. Porém, existem muitos jovens que destilam ofensas criminosas a outros alunos de faculdades distintas. Frases se referindo a classe social, gênero e raça de forma desrespeitosa são as mais faladas disfarçadas de “brincadeira”.
Quando o torcer vira confronto
A psicóloga Gleice Ross explica que a rivalidade e o pertencimento a um grupo têm um papel central nesse tipo de comportamento. Ela esclarece que “quando o jovem se identifica fortemente com um grupo ou time, pode desenvolver uma espécie de ‘nós contra eles’, o que reforça atitudes de confronto”.
Para ela, esse grande desejo de defender o grupo e mostrar lealdade pode levar a intolerância ao outro quando o jovem não tem suas questões bem resolvidas. “Essa identidade coletiva, quando mal conduzida, pode legitimar atitudes agressivas como forma de proteger ou afirmar o grupo a que se pertence”, diz.
Gabriel Ferreira faz Medicina na PUC e é apaixonado por jogos universitários. Ele participou em todos os jogos e modalidades que teve a oportunidade e até chegou a ser presidente da Associação Atlética Acadêmica Medicina Puc Poços (AAAMPP). Para ele, o que gera essas ofensas é uma tentativa de desestabilizar a equipe adversária. “Em consequência disso, em casos isolados em que jogadores e torcida não possuem equilíbrio psicológico para conseguir se esquivar ou ignorar tais ofensas, há o desenvolvimento de brigas como em outras competições”, responde.
Os casos extremos chocam. Porém, mesmo sendo recorrentes em todo o meio esportivo e de competições, generalizar esses casos e concluir que os estudantes vão lá apenas para ofender e ir atrás de briga não é correto.
Gabriel relata que nunca presenciou agressões ou violência nos jogos universitários. “Nossa postura sempre foi de repúdio contra qualquer tipo de ofensa ou violência, tendo a felicidade de nunca ter envolvimento com acontecimentos desse âmbito em todos os jogos que participamos”, conta. Ele frisa que isso é algo que se repete em qualquer jogo de disputa, não sendo exclusivo do ambiente universitário.
Para a estudante Emily Haiany, que cursa Odontologia na UNIFAL, às vezes os alunos ultrapassam sim o limite do respeito, mas que na maioria das vezes é uma rivalidade saudável dentro da competição. Os embates mais recorrentes e conhecidos são entre as faculdades privadas e públicas. “No geral, a briga é entre particular e pública com uma tentando ser melhor que a outra”, completa.
As redes sociais também desempenham um papel crucial nessas horas. No TikTok, por exemplo, circulam vários vídeos dos dois lados da torcida cantando desde frases totalmente preconceituosas com os alunos, até paródias engraçadas fazendo alegorias com as diferenças das faculdades. “Explode seu cartão na maior mensalidade, é lindo ver seu pai pagando a minha e a sua faculdade” e “Ô federal, fala baixinho, quem tem 10k não envelhece no cursinho” são alguns exemplos das músicas que a torcida canta para os seus adversários. Nos comentários, pessoas fomentam ainda mais a situação.
Saudável até que ponto?
Um caso muito recorrente de violência nas faculdades são os trotes que acontecem no início do curso. Com o aumento dos casos foi aprovada uma lei em agosto de 2024 no estado de São Paulo que proíbe trotes violentos em faculdades. A instituição deve tomar medidas de prevenção e responsabilização podendo determinar até mesmo a expulsão dos alunos.
Nessa fase, quando alguns se desdobram para conciliar os estudos e o trabalho, tudo isso pode ser difícil e sobrecarregar os jovens. A rotina dos estudantes precisa desses momentos de lazer. Porém, quem usa esses espaços para cometer crimes contra seu adversário deve ser punido. “A gente sempre pregou por torcer pra gente, não torcer contra os outros”, conta Gabriel.
“A mediação de conflitos, a inclusão de temas como inteligência emocional nos projetos pedagógicos e o estímulo a práticas colaborativas entre grupos podem prevenir esse tipo de conflito e transformar o esporte em um espaço de crescimento saudável”, finaliza a psicóloga.