Abril é mês da luta pelos direitos dos povos originários.
Natália Goes
Conhecido como Dia do Índio, o dia 19 de abril é marcado pela luta e resistência dos povos indígenas do Brasil em busca dos seus direitos. A data para a comemoração da cultura indígena, entretanto, não é unanimidade entre a população indígena.
Mesmo buscando, lutando e zelando ainda existe conflito, discriminação e oposição. Jõprykatyre Sales Jõkantytyre do povo Gavião Parkatêjê em Marabá no Pará expõe que “a data para nós, indígenas, é uma forma de desrespeito. Sofremos preconceitos das pessoas dizendo que não iremos conseguir, falam que só conseguimos entrar em uma faculdade por conta das cotas.”
Origem da data
A origem da data remete a um protesto dos povos indígenas do continente americano na década de 1940. Nesta data, foi organizado um congresso no México propondo o debate de medidas para proteger os povos indígenas no território e sua qualidade de vida.
O Congresso Indigenista Interamericano, realizado em Patzcuaro, aconteceu entre os dias 14 e 24 de abril de 1940. Os representantes indígenas foram convidados a participarem do congresso, mas eles haviam negado a participação no evento por medo de não terem voz ou vez nas reuniões que seriam comandadas por líderes políticos dos países participantes.
Nos primeiros dias os indígenas fizeram um boicote e passados alguns dias eles entraram em acordo e decidiram participar do congresso, já que seriam discutidos problemas que dizem respeito a eles. A data da importante decisão foi 19 de abril, por isso foi escolhida para celebração do Dia do Índio.
Do continente americano somente Paraguai, Haiti e Canadá ficaram de fora, ao todo foram 55 delegações. Entre os indígenas, eram 47 representantes dos povos de todo o continente. No caso do Brasil, o delegado enviado foi Edgar Roquette-Pinto, que não era índio, mas foi antropólogo, etnólogo e estudioso de povos indígenas da Serra do Norte, na Amazônia.
Algumas medidas genéricas foram definidas no congresso em favor da defesa dos povos indígenas. Entre elas, estavam o respeito à igualdade de direitos e oportunidades para todos os grupos da população da América, respeito por valores positivos de sua identidade histórica e cultural a fim de melhorar situação econômica, adoção do indigenismo como política de Estado, e estabelecer o Dia do Aborígene Americano em 19 de abril.
Nem todos os países adotaram a data como dia de celebração da cultura indígena, e no Brasil levou tempo até ser oficializada, pois o país não aderiu às deliberações do congresso. Apenas em 1943, o Dia do Índio foi instituído via decreto-lei, pelo então presidente Getúlio Vargas, que foi convencido pelo general Marechal Rondon, que tinha origem indígena por seus bisavós. Em 1910, Marechal Rondon chegou a criar o Serviço de Proteção ao Índio, que depois viria a se tornar a atual Funai (Fundação Nacional do Índio).
Luta e resistência
Os povos indígenas têm lutado contra o retrocesso na demarcação de terras, o desmonte de políticas públicas na área da saúde e educação e têm lutado por uma bancada forte no Congresso Nacional. Além disso, batalham contra o estímulo do governo Bolsonaro para que garimpeiros, madeireiras e o agronegócio invadam territórios indígenas sem qualquer preocupação ambiental.
Uma das principais lutas dos povos originários é pela continuação da existência, dos costumes e da língua. “Falar sobre a questão indígena é falar de resistência, muitas comunidades já perderam sua língua. Na minha comunidade lutamos para a continuação da língua para que as crianças possam aprender, pois não existe mais anciões para ensinar”, afirma Jõprykatyre. Segundo o censo do IBGE de 2010, a população indígena residente no Brasil contabilizada pelo quesito cor ou raça foi de 896,9 mil pessoas, com 305 etnias e 274 idiomas, apenas 10% da população indígena de 1500.
Durante o mês de abril, dos dias 4 ao dia 14 aconteceu o Acampamento Terra Livre(ATL), em Brasília, com o tema: “Retomando o Brasil: Demarcar Territórios e Aldear a Política”. O evento, que ocorre há 17 anos, reúne debates sobre a política indigenista, exposições e manifestações culturais, além de socializar o resultado de pesquisas relacionadas à preservação das culturas originárias.
Jõkantytyre destaca que as lideranças indígenas estão crescendo, as pessoas estão aprendendo que o índio não é o ser que não tem acesso a internet, que não pode ter carro, que não pode se vestir bem. O movimento indígena também se fortalece nas frentes femininas. “A data serve para nossa reflexão. Não tem como falarmos de indígenas e não falar de política, o dia é para facilitar e ajudar. Queremos respeito e atenção para nossa cultura, por aquilo que zelamos e amamos fazer – amor pela natureza, amor pelas pessoas”, explica Jõprykatyre.