A ordem de nascimento pode definir a personalidade da criança, segundo o psicanalista austríaco Alfred Adler.
Raquel Condor
Não se trata nem do mais velho nem do mais novo, mas sim do filho do meio. O filho que tende a receber menos atenção por parte dos pais em comparação aos outros. Aquele que ao sentir que teve mais “liberdade” que os outros irmãos, pode chegar a desenvolver certas características como consequência da pouca atenção por parte dos seus pais.
De acordo com a teoria do psicanalista austríaco Alfred Adler, a ordem de nascimento tem uma forte influência sobre como será a personalidade de uma pessoa quando ela crescer. Entretanto, não há base científica para essa teoria.
A síndrome do filho do meio pode ser verdade para alguns e uma mentira para outros. No entanto, os psicólogos explicam como a síndrome do filho do meio pode afetar a vida de uma criança não apenas na infância ou na adolescência, mas também na idade adulta.
Porque as crianças do meio tendem a receber menos atenção dos pais?
Ninguém nasce sabendo como ser pai ou mãe. Quando nasce o primeiro filho, tudo é novo, se aprende tudo desde zero. Ao nascer o segundo filho, já existe certa experiência, motivo pelo qual a atenção dada ao filho não é tão forte como com o primeiro. Então, nasce o caçula, que tende a ser o mais “mimado” pela família.
A psicóloga Javiera Urbina comenta que “à medida que os filhos crescem, os pais tendem a prestar mais atenção aos mais novos, os seus cuidados centram-se mais neles, pois sentem que têm de os proteger mais fortemente. O mais velho tinha mais atenção dos pais porque era o primeiro a nascer.”
“Quanto ao filho do meio, a atenção dos pais não foi tão intensa como com o mais velho ou como será com o mais novo. À medida que o filho do meio começa a crescer, é mais notório para ele que seus pais não ofereceram a mesma atenção para ele como com seus outros irmãos”, ressalta a profissional.
A psicóloga Gisela Meza diz que “os filhos do meio podem começar a tornar-se mais competitivos quando percebem que não receberam ou não recebem a mesma atenção que os irmãos, mas que a competitividade é normalmente algo interno, que são eles que começam a perceber tudo como uma competição contra os irmãos.”
Que características podem se manifestar no comportamento do filho do meio?
Meza comenta que se tornar mais independentes, apresentar atitudes de ciúmes, começar a ser mais competitivos ou tornar-se rebeldes podem se considerar características apresentadas no comportamento do filho, conforme vai crescendo.
“A rebeldia é um traço mais comum nos filhos do meio”, explica. “A necessidade de receber atenção dos pais é grande e eles não medem as coisas que começam a fazer, por isso, quando percebem que, ao comportarem-se dessa forma, os pais lhes dão atenção, tendem a fazê-lo com mais frequência”, menciona.
Meza ainda explica que não são negativas todas as características desenvolvidas pelos filhos do meio. “Desenvolver rapidamente competências sociais tende a ser mais fácil para eles, porque ao quererem a atenção dos adultos, começam a correr mais riscos, a querer envolver-se em coisas diferentes, o que pode ser benéfico para eles no futuro”, salienta.
No entanto, Meza ressalta que é importante ter em mente que a síndrome não é algo biológico, mas sim social. “O entorno em que cresceu, a relação com os pais e irmãos desde criança são aspectos que podem influenciar muito, mas não garantir como será o comportamento ou personalidade do filho no futuro. Nem sempre todos esses filhos desenvolvem as características apresentadas”, ressalta.
Sergio Souza conta que, em sua experiência como filho do meio, foi na adolescência que ele se tornou mais consciente da pouca atenção que sua mãe dava a ele em comparação com seus irmãos. No entanto, ele nunca sentiu ciúmes de seus irmãos porque não era culpa deles o fato de receberem mais atenção do que ele. “Conversamos sobre o assunto com meus irmãos e eles fazem com que minha presença seja notada muitas vezes, pois estão cientes do problema de atenção”, menciona.
Urbina indica que tais características que o filho do meio pode desenvolver, dependerão sempre do funcionamento psíquico dessa pessoa e do contexto em que ela se desenvolveu.
A vida adulta da criança pode ser afetada pela síndrome do filho do meio?
A saúde mental da criança pode se ver afetada não só na etapa da sua infância ou adolescência, mas também pode chegar a afetar grandemente a sua vida adulta por não ter tido um relacionamento próximo com seus pais.
Segundo pesquisadores da University of Minnesota, a falta de atenção dos pais na infância pode levar a relacionamentos não saudáveis na vida adulta. Meza comenta que a idade adulta é afetada pela síndrome, especialmente nas relações. Segundo ela, por terem que lutar constantemente pela atenção dos pais quando eram crianças, tendem a temer a rejeição, o que pode levar à dependência emocional, inseguranças ou a agradar o parceiro para não perder sua atenção.
“Quando somos crianças, normalmente vemos os nossos pais como uma figura orientadora, como um herói, digamos assim. Por isso, quando uma criança que teve de estar constantemente a fazer coisas para chamar a atenção dos pais cresce, sente que tem de fazer o mesmo com as outras pessoas”, indica Meza. “As suas ações serão motivadas pela insegurança e terão uma maior tendência para se agarrarem às suas relações”, finaliza.