Reflexos da pandemia entre os evangélicos

In Cultura, Geral

Em decorrência do isolamento, religiosos buscam adaptação dos cultos e na rotina espiritual

Franciele Borges

Desde março de 2020 a pandemia estremeceu as atividades da sociedade e dos movimentos que ela consome. Shows, teatros, esportes, festas e cultos religiosos foram terminantemente proibidos, afetando as produções e consumos. As igrejas evangélicas, no princípio, precisaram remodelar sua assistência aos fiéis, migrando para transmissões de cultos on-line.

Uma pesquisa realizada pelo site Inviseblie College, apontou que 74% das igrejas evangélicas adotaram a transmissão ao vivo para suprirem a ausência dos cultos presenciais. O distanciamento trouxe um novo olhar sobre o relacionamento entre os membros das igrejas e como a tecnologia foi útil para a continuidade nas atividades religiosas, uma vez que os membros tiveram possibilidades nas interações entre eles.

Para o ancião da Igreja Adventista do Sétimo Dia no bairro Nonoai, em Porto Alegre, Diogo Brachmann no início os membros viram o novo formato como novidade, mas se incomodaram ao longo dos meses. “Quando isso começou a virar rotina, os membros começaram a sentir falta de congregar (frequentar aos cultos), a igreja e estarem juntos, explica.

Tecnologia e adaptação

Não é novidade que os cultos evangélicos eram transmitidos nos perfis das denominações em redes sociais como Facebook, Instagram e Youtube. Eram transmissões menos frequentes e dedicadas especialmente às grandes igrejas. Com a chegada da pandemia, o departamento de Comunicação das igrejas passou a receber atenção especial da liderança. O pastor Michel Moroz é responsável por cuidar de seis igrejas em Porto Alegre e viu vantagem na valorização da comunicação e diz que o departamento é essencial para que o culto aconteça: “A igreja investiu agora em recursos na compra de equipamentos para transmissão e está interagindo com os irmãos (forma como os membros se chamam) e buscando um caminho.”, acrescenta.

Empresas especializadas em sistemas de transmissão favorecem pessoas da comunicação das igrejas melhorarem a qualidade das lives durante os cultos. A SITEHOSTING, fundada em 2000, com 26 colaboradores, presta atendimento para diversas empresas, incluindo igrejas. Isso acontece por meio de vendas de equipamentos modernos, cursos online, presenciais e assistência técnica.

Outro ponto importante é que, durante a pandemia, algumas pessoas se acostumaram com o fato de não irem à igreja e isso causou o distanciamento da espiritualidade dos membros. Eles permaneceram em casa nos momentos em que os cultos aconteciam presencialmente, e isso culminou no distanciamento voluntário das participações on-line. O Diretor de Marketing Digital da Sede Sul-americana da Igreja Adventista, Carlos Magalhães, explica que “A experiência entre assistir a um culto em um templo físico é muito diferente daquela de assistir a um culto em um telefone celular ou na tela da TV. O ambiente do atendente remoto também é diferente porque compete com outras coisas que desviam a atenção.” Os distritos responsáveis pelas transmissões dos cultos entenderam a facilidade que esse grupo e demais membros têm de ausentar-se das reuniões. Foram necessários ajustes na duração e na ordem que a programação era transmitida.

Os cuidados das igrejas se estendem além das atividades tecnológicas priorizando a atenção pessoal. Marcar a presença nas famílias que são membros das igrejas tem atingido o propósito dos líderes espirituais, embora o respeito às regras de distanciamento seja mantido. A intenção é que não tenha a sensação de distanciamento emocional por parte daqueles que deveriam cuidar e dar atenção. Entretanto, na incerteza de quando poderão voltar às reuniões e aglomerações costumeiras, algumas pessoas que moram sozinhas foram afetadas negativamente com o isolamento social. Jair Borges, aposentado, viúvo e mora na zona rural de Eldorado do Sul, conta que, por não receber e nem fazer visitas, tem sensação de abandono: “eu fico sozinho o dia todo aqui, quero visitar as pessoas e todo mundo ‘tá’ com medo desse vírus.” lamenta. “no sábado é triste aqui porque não dá para ir ao culto. Aí eu passo o dia lendo e fico no YouTube, mas chega uma hora que cansa.”, conclui. Na visão do pastor Michel, o grupo que mora sozinho não recebe visitas, mas é atendido virtualmente nas transmissões do culto: “Se o assunto é culto, estão sendo atendidos como os demais membros através das lives. Alguns aprenderam a fazer isso.”, ressalta Michel. Em contrapartida, Diogo, que é do mesmo distrito do pastor Michel, diz que o grupo da sua igreja tem dado atenção especial para essas pessoas solitárias. “Os professores da Escola Sabatina procuram ter um olhar diferenciado para essas pessoas que moram sozinhas e muitas vezes são convidadas para um almoço. Tem tido um cuidado com essas pessoas que estão sozinhas” esclarece.

Alimento espiritual

Apesar da maioria dos templos religiosos em suas variadas denominações, forma de cultos e crenças suspenderem os cultos presenciais, o senso de ensinar novas pessoas para a crença de determinada religião, não foi afetada, apenas adaptada. No cenário pandêmico, as igrejas permaneceram ativas em distribuição de estudos bíblicos, vídeos meditacional, e conversas espirituais pelo WhatsApp. Em dezembro de 2020, Ana Elisa Fernandes, uma dona de casa com 22 anos, membro da Igreja Assembleia de Deus, optou por exercer suas funções religiosas na Igreja Adventista do Sétimo Dia. “Eu queria entender melhor (como os Adventistas obedeciam às doutrinas bíblicas) buscando na bíblia, tive várias controvérsias de muita coisa que eu aprendi desde a infância”, explica. Mesmo com a quarentena, Ana Elisa aceitou a visita de dois membros do bairro Nonoai para receber os esclarecimentos. “Procurei uma outra igreja que condiz com essa verdade, então descobri que é a IASD e fui muito bem acolhida, os líderes me procuraram para que, mesmo em meio a pandemia, eu tivesse um suporte.”, finaliza.

A pandemia não deu sinais de quando vai acabar e, na incerteza, fiéis, líderes, simpatizantes das igrejas evangélicas no Brasil seguem o ritmo de suas pautas, ainda que em passos lentos.

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