Projeto de lei foi instituído em 2001 com objetivo de garantir a diversidade de títulos em exibição nos cinemas.
Rayne Sá
O ano de 2023 foi marcado por uma grande safra de produções nacionais, entre elas, as cinebiografias, que revisitam a trajetória de grandes personalidades brasileiras, como por exemplo, a cantora Gal Costa em “Meu nome é Gal”, lançado em outubro. Por outro lado, as salas de cinemas também foram ocupadas por filmes estrangeiros, como “Barbie” e “Oppenheimer”, ambos sucessos de bilheteria.
Apesar do expressivo número de lançamentos nacionais, os espaços que a indústria cinematográfica brasileira ocupa nas empresas exibidoras, em relação à divulgação e opções de horários, são menores.
Cota de Tela
No Brasil, a Cota de Tela foi instituída em 2001, com o objetivo de determinar a obrigatoriedade da exibição de filmes nacionais nas salas de cinemas, sujeito a multa em caso de descumprimento da regra, que conforme a Agência Nacional do Cinema (Ancine), corresponde a 5% da receita bruta média diária de cada cinema. Vale lembrar que, desde 2021, a CT estava sem validade.
Para a cineasta Thais Scarbio a competição se torna injusta sem as cotas. Ela pontua ainda que, “as empresas americanas, principalmente, investem muito na distribuição da sua cultura por meio dos filmes.”
Em setembro, a Câmara dos Deputados aprovou um projeto de lei que prorroga a medida até 2033. O texto, que agora está em análise no Senado, passou a ser discutido novamente. Questionada se na sua experiência a Cota de Tela tem contribuído para trazer maior visibilidade e reconhecimento ao cinema nacional, Thais responde que “mais ou menos.”
“A cota garante que tenham produções nacionais e permanência desses filmes nas salas por um tempo que as pessoas consigam assistir. São produzidos mais de 100 filmes nacionais por ano e temos acesso a 1% deles”, explica.
De acordo com a Ancine, em alguns casos, os filmes brasileiros têm sido exibidos em sessões antes das 16h, o que indica que sem a cota de tela, as produções internacionais passam a ser mais priorizadas na cadeia produtiva do cinema brasileiro.
“Barbie estava em quase 90% das salas de cinemas. O público não teve opção, quem foi ao cinema na época foi obrigado a assistir um filme americano. As salas precisam te dar opções de escolhas para não ser um monopólio cultural”, defende a cineasta.
Espaços culturais ajudam a promover o audiovisual brasileiro
A Cinemateca Paulo Amorim, em Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, é um desses espaços que tem por objetivo dar visibilidade ao cinema nacional e latino-americano. Partindo da exibição de filmes independentes e mostras especiais, o local também promove trocas entre diretores, elenco e espectadores que participam das sessões comentadas.
A curadora da Cinemateca, Mônica Kanitz, defende que a Cota de Tela é uma política pública fundamental para a divulgação do cinema e também da cultura brasileira de uma maneira geral. “Enquanto muitos entendem a CT como uma intromissão do governo no cotidiano das salas exibidoras, acredito que trata-se de garantir espaço e visibilidade para as nossas produções. Afinal, do que adianta investir na indústria audiovisual se os filmes não puderem ser vistos?”, argumenta.
À frente da coordenação e curadoria do espaço desde 2011, Mônica celebra a diversidade de filmes e horários que a Cinemateca oferece ao público. “Como curadora aqui da Cinemateca Paulo Amorim, tenho comprometimento com as exibições de filmes brasileiros e gaúchos. E, por isso, a Cota de Tela não é algo que interfira na nossa programação, já que cumprimos em dobro (ou talvez até mais)”, relata.
No ano em que a Cota de Tela não estava regulamentada, a curadora destaca 90 filmes brasileiros em cartaz, seja em sessões regulares ou mostras especiais exibidas na Cinemateca.
“Praticamente todas as produções nacionais lançadas neste ano foram exibidas aqui nas nossas salas, ficando em cartaz pelo menos duas semanas. Um destes filmes, o documentário “Elis & Tom”, foi um dos filmes de maior público do ano aqui nas salas, enquanto as mostras especiais trouxeram de volta alguns títulos mais antigos e representativos da nossa produção”, conta Mônica.
Em 2021, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que a Cota de Tela é constitucional.
Foto: Rayne Sá