Geração Z: a mais endividada

In Economia, Geral

Facilidade de acesso ao crédito e cultura do consumo impulsionam a inadimplência entre a geração Z.

Isabella Maciel

Os jovens da geração Z estão se endividando cada vez mais e, muitas vezes, antes mesmo de conquistarem a estabilidade financeira. O cartão de crédito, aliado à cultura do consumo e à facilidade de acesso ao crédito por meio de bancos digitais, tem sido um dos principais vilões desse cenário.

Com uma média de gastos mensais de R$1.250 no cartão, valor próximo ao salário mínimo vigente, jovens até 25 anos comprometem até 60% da sua renda apenas com a fatura. O problema é que parte desses jovens não conseguem arcar com os pagamentos, levando a um índice de inadimplência maior que o de outras gerações.

O comportamento financeiro da geração Z

De acordo com a economista conselheira do Conselho Regional de Economia do RS, Janile Soares, o endividamento dos jovens tem relação direta com mudanças no comportamento de consumo. “A maneira como todas as gerações se relacionam com o dinheiro vem mudando nas últimas décadas, muito disso se dá pelo avanço da tecnologia. Os jovens da geração Z são praticamente nativos digitais, crescendo em um mundo digitalizado, estão acostumados à gratificação instantânea, o que se reflete no consumo”, explica.

A troca da aquisição de bens por experiências é outro fator relevante. Janile acrescenta que as redes sociais estimulam esse comportamento, fazendo com que os jovens demorem mais a direcionar recursos para imóveis e veículos, ao contrário das gerações anteriores. Somado a isso, o mercado de trabalho instável e a perda de poder de compra impulsionam o uso do crédito como forma de cobrir despesas.

A experiência da compra

A procura dos consumidores por crédito no Brasil fechou com alta de 0,6% no ano passado. Matheus Machado, educador financeiro, acredita que a questão do endividamento jovem vai além da falta de planejamento. “Essa geração é extremamente motivada por experiências. Eles não querem esperar até a velhice para aproveitar a vida, mas falta equilíbrio. O problema não é apenas financeiro, mas também cultural e comportamental”, afirma. 

Elise Lopes, jovem recém-formada no ensino superior, compartilha do pensamento de viver uma experiência através da compra. A jovem conta que o ato de comprar vai além da simples necessidade e se tornou uma forma de recompensa pessoal. Para Elise, o prazer das compras está atrelado à sensação de estar se presenteando, seja presencialmente ou online. “É tão bom, eu sinto como se eu tivesse me recompensando, sabe?! Tipo assim, ok, você passou por uma semana puxada, e aqui está sua recompensa. Eu tô me mimando de alguma forma”, compartilha.

A experiência se estende para o ambiente digital, onde a espera pela chegada do produto adiciona uma camada de expectativa. “Comprar online é ainda mais excitante, porque tem toda aquela espera, acompanhar o rastreio, ver quando chega. Finalmente chegou o produto que eu queria tanto!”, diz. No entanto, Elise reconhece que a sensação muda quando a compra é por necessidade. “Quando eu preciso de alguma coisa, ter que gastar o meu dinheiro com algo obrigatório é triste. Parece que meu dinheiro só está indo embora”, reflete.

O impacto da digitalização no endividamento 

A facilidade de criar contas digitais e ter carteiras virtuais também tem contribuído para esse cenário. De acordo com Relatório de Cidadania Financeira, 67% dos adolescentes já possuem cartão de crédito. Para Janile isso pode ser um risco: “as fintechs trouxeram inclusão financeira, mas também facilitaram o endividamento. A quantidade e a velocidade que o crédito se faz mais acessível através das instituições e, muitas vezes, concedido sem critérios rígidos de análise, levando muitos jovens a acumularem dívidas rapidamente”, alerta a economista.

A inadimplência precoce pode comprometer a vida financeira dos jovens a longo prazo. “Quando um jovem atrasa pagamentos, seu score de crédito cai, dificultando futuros financiamentos, como a compra de imóveis ou veículos. Além disso, dívidas elevadas na juventude dificultam a construção de uma reserva financeira, impactando a estabilidade na vida adulta. Por isso é sempre importante o planejamento financeiro no curto, médio e longo prazo e começar o quanto antes”, pontua Janile. 

Como prevenir e remediar as dívidas

Matheus acredita que a educação financeira deveria ser incentivada desde cedo. “Se não ensinarmos os jovens sobre dinheiro, eles continuarão a reproduzir padrões de consumo imediatistas. Muitos sabem que precisam gastar menos do que ganham, mas não conseguem colocar isso em prática porque foram criados em um ambiente que incentiva o consumo desenfreado”, analisa. 

Para evitar o endividamento, Matheus recomenda três passos fundamentais:

  • Autoconhecimento financeiro: compreender quanto se ganha, quanto se gasta e como se gasta, ou seja, para onde vai o seu dinheiro. Com esse controle financeiro, deve-se partir para uma análise mais honesta sobre a sua situação atual com a elaboração de um diagnóstico, algo simples, basicamente, após analisar despesas e receitas, entender se está gastando bem ou mal. Naturalmente, ao se gastar mal, existe uma grande oportunidade de melhorias no orçamento, com cortes e reduções.
  • Definição de metas: ter objetivos claros ajuda a evitar gastos impulsivos. Sonhos que quer realizar, para que exista motivos fortes o suficiente para renunciar a um prazer imediato em busca de algo muito maior ali na frente.
  • Mão na massa: a partir disso, vá repetindo esse ciclo positivo que ainda irá passar por aplicar aquilo que se poupa para poder competir com a perda do poder de compra do dinheiro causada pela inflação e taxa de juros do país.

Para quem já está endividado, ele propõe um PLANO de sete passos:

  1. Controle financeiro: saber para onde vai o dinheiro é o primeiro passo. Quem não controla o quanto gasta e o quanto ganha, e não sabe para onde vai o seu dinheiro, está escolhendo ir para qualquer lugar, inclusive, para as dívidas.
  2. Análise e diagnóstico: com o controle bem-feito, é hora de analisar seu orçamento e chegar a um diagnóstico que irá apontar o estado da sua vida financeira, podendo este ser crítico, ruim, razoável, bom ou excelente. 
  3. Reduções de cortes de gastos: cortar gastos que não são essenciais. Para quem tem dúvidas sobre onde cortar, faça uma lista de prioridades e comece diminuindo ou eliminando a partir das menos importantes.
  4. Aumento de renda: buscar fonte de renda extra.
  5. Metas: qual é o seu sonho? Ou quais são os seus sonhos? Só deixaremos de viver algum prazer ou alegria hoje, se existir um prazer ou alegria muito maior nos aguardando lá na frente. É o mesmo que dizer, só deixaremos de gastar com algo de menor impacto ou nenhum impacto positivo hoje, se tivermos objetivos maiores a realizar.
  6. Investimentos: não poupamos e deixamos o dinheiro parado na conta corrente ou poupança. No mínimo, pegue suas economias e aplique em um CDB de liquidez diária ou no Tesouro Selic, estes contribuirão para a preservação do poder de compra do seu dinheiro e chegarão mais próximos de quitar sua dívida.
  7. Repita o ciclo: nossa vida não é estática, parada. Pelo contrário, é intensa e dinâmica, por isso, temos que sempre, sempre mesmo, mensalmente, visitar estes 7 passos e repeti-los, pois pode ser que hoje você possa poupar R$100,00, R$200,00, mas daqui a um tempo, poderá chegar em R$500,00, R$700,00.

Matheus explica que é importante entender que esses passos darão resultado com o passar dos meses, assim como na atividade física, a vida financeira demanda um tempo para começar a dar frutos, mas cuidando bem do seu jardim, sempre haverá motivos para sorrir. 

O papel da educação financeira

Matheus enfatiza que a educação financeira deve ser incentivada desde cedo. “Na infância e na adolescência formamos nossa percepção sobre dinheiro. Quem recebeu bons exemplos tende a ser mais consciente nos gastos”, afirma. Educação financeira não é apenas matemática. A pergunta certa não é ‘quanto gastar’, mas ‘por que gastamos assim?’.

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