A menos de dois meses para as eleições, metade dos eleitores brasileiros prefere não comentar sobre política para evitar discussões.
Camilly Inacio
De acordo com uma pesquisa realizada nos dias 27 e 28 de julho deste ano realizada pelo instituto DataFolha, cerca de 49% dos eleitores brasileiros deixaram de falar sobre assuntos relacionados à política para não gerar discussões verbais ou físicas, seja numa roda de amigos, almoços de família ou mesmo na internet.
A universitária Rafaela Cristine conta que não tem o costume de expor suas opiniões, principalmente sobre assuntos que podem ser considerados polêmicos. Segundo ela, “quase sempre esses assuntos, principalmente a política, causam discussões desnecessárias, pois existem pessoas que não conseguem ter conversas pacíficas sobre isso.”
Desde que percebeu isso, ela evita falar sobre o assunto em qualquer tipo de roda social. Ela conta que já presenciou discussões e não se sente confortável em participar das mesmas. De acordo com ela, “a maioria das pessoas não consegue ter calma ao falar sobre política. Eu gosto de entender os principais assuntos e ideologias políticas, mas falar sobre isso é um problema”, relata.
Importância da política no cotidiano
O conceito de política tem sido muito associado à corrupção. Por isso, essa palavra acabou ficando manchada. Delza da Hora é historiadora, socióloga e mestranda em Sociologia e Ciência Política e comenta sobre como é difícil participar da política atualmente. “Leva tempo e exige dedicação, por isso muitos entendem como uma coisa chata e cansativa”, declara a socióloga.
Entre os motivos para a escolha de metade do eleitorado brasileiro em não falar sobre política, o medo é um dos grandes fatores. Segundo a socióloga, “desde 2018 temos um cenário ruim para a democracia brasileira que ficou polarizada entre dois lados, foram eleições em que as pessoas sofrerem muitas ameaças e agressões ao falar em quem votariam.”
Ela continua dizendo que é como se “declarar um voto significasse declarar uma guerra com as pessoas que você convive”. Isso resulta em diversos tipos de agressões verbais e até físicas para aqueles que declaram em que ideologias políticas acreditam ou falam em quem vão votar.
Prejuízos sociais
No entanto, não falar sobre o assunto gera diversos prejuízos sociais, principalmente para a democracia. Delza aponta dois grandes pontos importantes em falar e participar da política no cenário em que vivemos. Em primeiro lugar, “se a gente não tem participação política, automaticamente a gente não tem a democracia fortalecida”, expõe a cientista social.
Em segundo lugar, Delza da Hora segue falando que quando as pessoas deixam de se importar com a política como deveriam, ocorre uma descredibilização dos cientistas políticos. “Vamos estar falando sobre uma coisa que não importa para o povo, e estudando sobre uma coisa que parece não interessar a sociedade mas é pertinente para a vida do cidadão”, opina.
Falar sobre política é participar da política. “Ela está no nosso cotidiano, não é só sobre concorrer a um cargo eletivo, mas ela é feita todos os dias. Quando o cidadão desperta para a necessidade de participar das decisões públicas, ele está fazendo política”, destaca Delza.
Apesar do cidadão comum ter grande relevância na política, “muitos se esquecem que o poder público em si não tem poder sem o próprio público”, como nos lembra a socióloga. Por isso, quando a população nega esse papel político, ela está abrindo mão de participar de coisas que influenciam a própria vida.
