Crenças limitantes: o adulto autista e a sociedade

In Geral
Autismo

Laura Rezzuto

Existem cerca de 70 milhões de autistas no mundo, grupo de pessoas do qual faço parte. Porém, hoje, mesmo o número sendo tão grande e milhares provando ter a plena capacidade de desenvolver uma vida estável e tão comum quanto quem não possui o espectro no gene, o preconceito e as barreiras para que haja uma inclusão na sociedade apenas crescem. Neste texto, mesmo que de forma breve, tentarei esclarecer um pouco da visão por detrás desse espectro tão “conhecido”, mas tão pouco compreendido.

Viver com o autismo, distúrbio carinhosamente chamado de TEA (Transtorno do Espectro Autista) já é em si desafiador, pois afeta diretamente a nossa comunicação, instrução, relacionamento interpessoal e, principalmente, a forma como conhecemos e entendemos o mundo. Isso, infelizmente, instiga as pessoas a pensarem que todos vivemos em um mundo isolado e conectado com poucas pessoas.  

Certamente, se relacionar com o TEA significa abrir mão de tentar enxergar a realidade de uma só forma, como aquela que normalmente é imposta para todos desde o começo da infância. É observar, analisar e distinguir de múltiplas formas, e mesmo assim garantir que seja de uma forma consciente, com ética, acima de tudo; é ver e ouvir de uma forma completamente diferente dos demais. Porém, criar oportunidades e ocupar espaços da mesma maneira, com nossos conhecimentos e também desconhecimentos. 

Mas, afinal, como é a realidade no dia a dia? 

Barulho, toque, contato visual, metáforas, ironias, regras sociais e hipersensibilidade e sobrecargas são desafios do dia a dia, que ao fim dele costumam desencadear uma crise sensorial, ou seja, mexem com a forma como o cérebro do autista entende os sentidos. 

No campo profissional ou universitário, as barreiras normalmente são ainda maiores. Desde a infraestrutura até o preparo das instituições é limitado. Devido a isso, na maior partes das vezes, ou a instituição/empresa não admite o ingresso do autista, ou o próprio se priva de compartilhar sobre o espectro, para que assim haja a oportunidade de fazer parte daquele meio.

Vamos analisar um ambiente comum para a maioria das pessoas: transporte público. Existir em meio ao caos de uma cidade grande é totalmente estressante para qualquer pessoa: o barulho do motor dos automóveis, das buzinas e das pessoas não chega a ser agradável para os seus ouvidos, eu tenho certeza. Agora pense no autista. Deve ser insuportável, não é mesmo?

Além de tudo, pegar esses meios de transporte requer muito contato físico com pessoas que na maior parte das vezes você nunca viu na vida, afinal, a lotação desses transportes é extrema. Lembrando que os autistas têm hipersensibilidade a toque e barulho, então, já é quase uma missão. Por isso, mais uma vez trago a seguinte questão: imagine para eles?

Frequentar o shopping ou igreja, viajar de carro, barco ou avião e até mesmo ir ao cinema são atividades do cotidiano de um adulto típico(sem TEA), mas para os atípicos (com TEA) quase sempre são desagradáveis. No cinema, por exemplo, com suas salas escuras, telas coloridas e volume alto, não existe favorecimento para este grupo de pessoas, que quase sempre, são fotossensíveis. 

E o que pode ser feito pelo autista?

Ainda é preciso muito avanço por parte da sociedade quando o assunto é inclusão, seja através das adaptações certas nas áreas urbanas, no transporte, na infraestrutura ou na modificação dos recursos utilizados para as variadas partes da vida do ser humano. Uma coisa é certa, ainda existem dezenas de coisas perceptíveis e outras imperceptíveis que precisam do nosso olhar dedicado, empático e inclusivo.

Existem vários graus de autismo, e cada um, características diferentes. Alguns são um pouco mais complexos, já que apresentam a presença de doenças simultâneas com o próprio distúrbio, como TOC (transtorno obsessivo-compulsivo), depressão, ansiedade, TDAH (transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade) e TDA (transtorno do déficit de atenção). 

Além disso, a dificuldade para encontrar um profissional que seja capacitado acaba por atrapalhar a adaptação do atípico ao meio típico. No entanto, esses pontos não impossibilitam a maior parte das pessoas que carregam esse gene consigo, claro que, graças a muitos tratamentos.

É necessário, pelo menos, o conhecimento básico sobre o que é o autismo e como podemos amenizar a sobrecarga diária dessas pessoas tão capazes de atuar na mesma sociedade em que os outros atuam, mesmo que seja da sua própria forma. Afinal, sabemos que com o conhecimento certo e o convívio necessário é possível quebrar o preconceito que sim, ainda existe, além de ainda termos a oportunidade de praticar a forma como enxergamos e tratamos cada indivíduo e suas características tão originais dentro do espectro. 

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